terça-feira, 15 de abril de 2014

QUESTÕES DE ESTÉTICA DA LITERATURA (93)

                        Sigmund Freud   
Vítor Manuel de Aguiar e Silva. Teoria da Literatura. 6ª ed. Livraria Almedina: Coimbra, 1984.

3.3. A comunicação artística

Pág. 193 - "Alguns autores denegam à arte a natureza de fenómeno comunicativo, atribuindo-lhe tão-só a natureza de fenómeno expressivo (ou apresentando, quando muito, a comunicação artística como um epifenômeno da expressão originária e substantiva). Assim pensa, por exemplo, Eric Buyssens: 'Lártiste est l'homme qui, doué d'une sensibilité supérieure, éprouve certeines émotions en percevant certains faits et qui reproduit ces faits en les modifiant à sa façon afin de mettre en valeur les éléments qui l'ont ému. (...) Mais il n'y a là rien qui ressemble au désir de collaboration qui est la base des sémies. L'art ne répond pas à un besoin social, comme le fait le discours; il répond au besoin de manifester, d'extérioriser les sentiments esthétiques.'

Semelhante concepção do fenómeno estético, enraizada numa teoria romântica da criação, é insustentável por várias razões: reduz a uma espécie de epifania indifidual e a uma motivação emocionalista e expressivista, com exclusão de quaisquer factores de natureza semiótica - e, portanto, de natureza social -, o processo da produção artística; ignora que a obra de arte só existe qua obra de arte enquanto objecto de uma transacção estética, o que pressupõe um receptor como indispensável pólo do peculiar processo de intercompreensão representado por essa transacção estética; desconhece que, como observou Freud, mesmo as impulsões inconscientes só são exteriorizáveis artisticamente se puderem adaptar-se 'à realidade das estruturas formais, o que equivale, como agudamente (p. 194) compreendeu Gombrich, a equacionar o problema da produção artística em termos de código e de comunicação.

Sublinhe-se, todavia, que a concepção do fenómeno artístico como fenómeno comunicativo não implica a negação da existência no objecto artístico de relevantes aspectos de auto-remuneração e de autocatarse relativamente ao seu autor/emissor. O que ela rejeita é que se possa conceber a obra artística como ergon de um processo identificável com um jogo absurdamente solitário e intransitivo e como objecto que se consome e anula numa hermética relação narcisista com o seu autor.
(CONTINUA)

Nenhum comentário:

Postar um comentário

http://twitter.com/Menalton_Braff
http://menalton.com.br
http://www.facebook.com/menalton.braff
http://www.facebook.com/menalton.braff.escritor
http://www.facebook.com/menalton.para.crianças