Literatura – Menalton Braff – Literatura: o que é isso?
Uma das perguntas mais difíceis de se
responder (pelo menos em poucas palavras) é a do título acima. E isso por
diversas razões. Uma delas é o fato de ser um conceito histórico, isto é, o que
se pensa como sendo literatura não tem sido sempre a mesma coisa. O que se tem
por literatura ontem pode não ser mais hoje; e textos que nasceram com outra
finalidade que não a literária, atualmente são lidos como literatura. Outra
razão da dificuldade é a variedade de correntes críticas, em alguns pontos
coincidentes, em outros divergentes.
Apesar de todas as dificuldades, vamos tentar neste espaço,
encontrar algumas respostas que sejam mais consensuais, que permitam distinguir
um texto literário de um texto não literário. E isso, é óbvio, de acordo com
parâmetros contemporâneos.
Em que pese o fato de ser uma impropriedade vocabular,
devemos buscar o início da literatura, isto é, seu gênese, em períodos os mais
afastados de que temos notícias. Logo, precisamos recuar na História até o
homem da caverna. Lá vamos encontrar as primeiras narrativas, histórias com que
os mais velhos (portanto, mais experientes) procuravam educar as crianças. Essa
foi nossa primeira escola: um adulto, sentado ao pé da fogueira, e, cercado por
meninas e meninos, narrava fatos exemplares do dia a dia, com o intuito de os
preparar para a sobrevivência. Tais narrativas, que de literárias eram apenas o
gérmen inicial, justificavam-se porque o conhecimento abstrato é facilmente
esquecido, ao passo que a memória torna-se muito mais eficiente ao guardar uma
história. Ressalte-se que tais histórias tinham uma finalidade educativa e não
artística.
Além disso, eram textos orais, que não se fixavam, sendo a
literatura oral, sem letra ou littera, apenas uma designação de caráter
histórico e não pragmático.
Bem mais tarde, pode-se dizer que nas civilizações mais
antigas e mesmo na antiguidade clássica, tanto a prosa quanto a poesia
mantinham ainda seu caráter educativo. O poeta era uma espécie de profeta,
aquele que deveria educar o povo. Num patamar bem superior àquele do home da
caverna, mas mantendo muito das finalidades primevas. O mesmo acontecia com
textos narrativos, que, na verdade, tinham como objetivo a instrução, a
educação do povo. Tais formas textuais foram intensamente utilizadas pelos
sacerdotes da antiguidade, quando se propunham a educar o povo rude, incapaz de
assimilar conceitos abstratos.
O que se convencionou chamar de primeira manifestação
literária narrada, foi o Decamerom, de Giovanni Boccaccio, escrito entre 1348 e
1353. Nos cem contos de que se compõe o livro, não se encontram histórias
exemplares, que sirvam de modelo ao povo, que o instruam a respeito do que quer
que seja, que propaguem qualquer tipo de conhecimento. São histórias para o
puro deleite da leitura.
Dado este início do que se pode chamar com propriedade de
literatura, e por uma questão de espaço, precisamos interromper aqui nossa
dissertação, que pretendemos continuar no próximo mês.
Uma observação final: no início precisamos desta discussão
conceitual, mais árida, menos atrativa, mas isso para evitar, no futuro,
incompreensões possíveis. Quando se falar do que é e do que não é literatura,
será bem mais fácil o entendimento.
* Menalton Braff é escritor, com 21 obras publicadas e colunista
da revista Carta Capital
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