Resenha publicada no Caderno C, do jornal 'A Cidade', edição de domingo, dia 21 de agosto.
OS CONTOS DE MENALTON
(*) Ely Vieitez Lisboa
Recebi em junho, da Primavera Editorial, o livro mais
recente de Menalton Braff, O Peso da Gravata. Sem conseguir segurar minha
curiosidade, após ler o primeiro conto, que é ótimo, escrevi um comentário. Só
agora, após finalizar a coletânea, volto a falar sobre a obra.
Não é necessário repetir sobre a fertilidade da produção
literária do autor, o grande estilista que é Menalton, a riqueza de sua
linguagem, mas é necessário realçar a diversidade dos temas dos contos e a
impressionante variedade de procedimentos literários que emprega, como autor
maduro e consagrado de contos e romances.
No primeiro conto, que tem o mesmo título da obra, no final
ele usa o Realismo Fantástico, técnica atraente que o autor repetirá em O
Violinista e também em O Imperador de Papel, este último mais enriquecido ainda
com outra hipótese na trama, de um possível complexo caso de transmigração de
almas.
O conto Quatro Anos Depois é também surrealista: o suicida
que visita seu túmulo e narra sua desdita. Morreu de amor. Ou por não saber se
era amado; até o final resta a dúvida. Castigo eterno.
Em Janela do Velho Sobrado, o mistério permanece até o final, quando Elyseu parte, levado pela estranha figura, com dois buracos negros no rosto; a face macabra tudo diz. É a descrição perfeita das sensações preambulares da morte.
Em Janela do Velho Sobrado, o mistério permanece até o final, quando Elyseu parte, levado pela estranha figura, com dois buracos negros no rosto; a face macabra tudo diz. É a descrição perfeita das sensações preambulares da morte.
Uma característica de MB, é o emprego de frases curtas, às
vezes o estilo quase telegráfico e o uso da próclise no início das orações,
para realçar a oralidade, o que dá também mais leveza ao discurso. No conto
Acerto de Contas, são vários exemplos notáveis; com poucas palavras, o narrador
resume toda uma situação de vida da personagem e é também nesse conto que há o
emprego de uma rara figura de linguagem, a hipálage, que consiste em
atribuir-se a uma palavra o que pertence a outra, na mesma frase: “Trêmulas e
indecisas, as primeiras sombras da noite entraram atrás de Belmiro no bar do
Romeu” ...
No conto Uma Cara Muito Branca, uma personagem é Átropos,
figura grega inflexível, uma das três Moiras da Mitologia Grega que regram os
destinos, sendo sua contraparte romana conhecida como Morta, a mais velha das
Moiras, a Inevitável, a inflexível. A mesma personagem no famoso poema
Consoada, de Manuel Bandeira, que a chama pelo epíteto de A Indesejada das
Gentes, é muito mais séria e amigável. A de Menalton é um pesadelo.
Quase todos os outros contos que se seguem apresentam tramas
inusitadas, de sensações estranhas, clima de pesadelos, pessoas amargas, com
suas tragédias terríveis, sem solução, insuladas no seu mundo sombrio. Metáforas
dos tempos modernos? E em todos, a preferência pela narrativa truncada, jamais
linear e a linguagem com frases curtas, sincopadas, quando se encontram muitos
anacolutos (desvio do plano de construção da frase) e às vezes um tipo de
construção até mais ousado: “Por isso tinha deixado a porta aberta. Por onde.”
Enfatizem-se também os finais abertos, procedimentos que enriquecem o texto.
Comentar nessa rápida abordagem, o último conto Jardim
Europa, de quarenta páginas, portanto mais uma novela, no qual há múltiplas
personagens e temática social moderna, é praticamente impossível. Ele difere de
todos os outros; seria necessário muito mais espaço.
Ao terminar de ler uma obra de Menalton Braff, a primeira
sensação que se tem é de admiração pela criatividade fecunda de sua produção
literária e sempre de ótima qualidade. Segue-se depois o fato do seu grande
conhecimento da língua portuguesa, o estilo muito pessoal. O Peso da Gravata só
veio confirmar essas assertivas do laureado autor.
*Ely Vieitez Lisboa é escritora.
*Ely Vieitez Lisboa é escritora.
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