terça-feira, 15 de agosto de 2017

ORELHA

Esta coluna reúne apresentações de livros escritas por Menalton Braff. O título de hoje é "Um exílio e um reino", de Adhemir Martins. 

Da janela do apartamento

Um exílio e um reino é o romance com que Adhemir Marthins se inaugura na arte de narrar. Fato raro entre nós, pois a maioria dos neófitos prefere o caminho aparentemente mais curto do conto, Adhemir Marthins se lançou à exaustiva tarefa de compor uma história longa, extremamente trabalhosa.

Este exílio relata as vicissitudes e peripécias por que passa Sophia, mulher, solteira, cinqüenta anos, vivendo sozinha em um apartamento de uma rua comum na cidade de Curitiba. Aliás, há várias referências à cidade, que Sophia contempla da janela de seu apartamento, como o Palácio de Cristal e este ícone da capital paranaense, que se chama Dalton Trevisan.

Desde a primeira página, o leitor pega carona entre as muitas reflexões e rememorações na mente de Sophia, de onde não mais sairá até o fim do romance. Sophia é a narradora protagonista, de cujo
ponto de vista assistimos a todos os acontecimentos e fazemos todas as avaliações. Sim, porque toda a realidade, fatos, valores, paisagens, tudo é subjetivizado por Sophia.

No capítulo 24 (são 84 capítulos curtos, pequenas cenas, lembranças fugazes, reflexões a respeito de sua existência), encontramos a seguinte passagem definidora da personagem: Algo lá dentro ditava uma ordem: “vá para o fundo, estão esperando por você”. Ao fundo, minha última opção? Estava começando a levar a sério esta amizade com a solidão. E bem sei que a solidão reside no fundo de nós mesmos. Lembrei-me de Virgínia Wolf enchendo os bolsos do casaco com pedras e caminhando para dentro do rio Olse até desaparecer para sempre.”

O romance, como ideia geral, trata de um caso de solipsismo, em que a solidão é uma busca constante, gerada pelo medo do mundo, do contato com as pessoas, e reforçada pela autossusificiência que vê nos seus semelhantes apenas obstáculos a superar. Neste sentido, o autor aproxima-se do jovem Sartre, de quem ainda traz vários outros fragmentos, como em “...condenada até o fim de meus dias à liberdade”.

Pela tentativa de levar uma vida recolhida e isolada, mas tentativa frustrada, tantos são os altos e baixos de sua existência, a história de Sophia por vezes lembra romances rocambolescos, em que predominam ações inesperadas, peripécias, súbitas mudanças no curso da vida. Com a diferença de que, no caso de Um exílio e um reino, os acontecimentos não são vistos de fora, do ponto de vista de um narrador demiúrgico,  senão pelos olhos da própria protagonista, pois é sua vida afetiva e intelectual o tecido com que se trama o romance.

Um comentário:

  1. Obriagado Menalton. Lembro-me com saudades do dia em que me encontrei com você no Teatro Pedro II e lhe pedi que fizesse a apresentação de meu livro. Este texto me encheu de orgulho. Grande Abraço.

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