segunda-feira, 4 de fevereiro de 2019

CARTAS DO INTERIOR

Esta coluna publica crônicas de Menalton Braff

O País dos Contrastes


Não consigo mais lembrar o nome do autor de conhecido ensaio sobre o Brasil. Foi um destes nomes cultuados e respeitados por terem dito coisas fundamentais sobre a nossa cara, a cara de brasileiros que nós temos, muitas vezes sem nos darmos conta disso. Mas não importa tanto assim o nome do autor, importa menos que a ideia defendida no ensaio. E lá se dizia, por exemplo, que no Brasil tudo acontece ao inverso. Fundou-se uma academia antes mesmo que houvesse escritores. E é grande a lista de tudo aquilo que o Brasil tem imitado de outros países sem atentar para suas necessidades específicas. Assim como inaugurar uma estrada de ferro e então esperar que em suas margens se produzam mercadorias precisando de transporte. Muita coisa no Brasil é assim: funda-se o templo porque isso bonito, porque é assim que fizeram outras nações. Quanto aos fiéis, bom, um dia haverá tanta gente na Terra que alguns fiéis haverão de sobrar para frequentar o templo.

Tais reflexões, que não são de graça, nesta época de agitações, me vêem à mente depois do encontro casual que tive com o Adamastor. Anda excitadíssimo, o Adamastor. Faz discurso, confabula pelos cantos aos cochichos, descobre inelegibilidades, ameaça escrever ao Presidente, fulmina candidatos, elege outros, e assim vai participando como pode de nosso processo eleitoral. Quando me viu,
investiu contra mim, que nem tenho participado de suas agitações, mas talvez por isso mesmo. Foi ali na praça da matriz.

Este povo, doutor, este povo é muito babaca, ele chegou me dizendo. O Adamastor, quando irritado comigo, me agride chamando-me de doutor. Ele sabe que eu não sou. Não sou como aquela outra que se dizia mestre mas nunca tinha ouvido falar em Currículo Lattes. Eu não. Em país sério ela já estava na cadeia por falsidade ideológica. Veja se pode, não vão votar no Viriato só porque ele é rico. Pode uma coisa dessas? Querem é votar num paraplégico porque ele precisa mais. E eu aqui dizendo pra eles que esta é a hora pra eles tirarem alguma vantagem do Viriato, que, se é rico, tem mais condições de ajudar os pobres, assim como nós. Não querem me escutar.

O assunto não me interessava. Cumprimentei o Adamastor e segui meu rumo sem dar resposta. Pobre Brasil, pensei no meu caminho. E então me vieram à memória fragmentos daquele ensaio sobre os contrastes. O Brasil instaurou uma democracia, agora está esperando que nasçam os cidadãos. A Câmara de Vereadores é vista como empreguinho para alguns necessitados ou como banca de favores com que se pagam os votos. Pobre Brasil! O voto existe, o que não existe é a compreensão de sua finalidade ou do modo como deve ser usado.

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