quinta-feira, 12 de dezembro de 2019

CRÍTICA LITERÁRIA

Esta coluna, iniciada em outubro, reúne críticas literárias. As primeiras postagens conterão textos de Wagner Coriolano de Abreu, publicados originalmente no livro SEMPRE AOS PARES, lançado pela Carta Editora.


AS BARBAS E A DITADURA

(Wagner Coriolano de Abreu)

No Brasil dos anos setenta, o cidadão que usasse barbas longas tornava-se um suspeito perante as autoridades e era procurado para esclarecimentos de ordem política, social e profissional. O barbudo que ficasse a fumar seu cigarro na esquina, por exemplo, já se enrolava junto aos donos do poder e seu órgão de informações.


Foi o tempo da ditadura militar, período em que o país ficou nas mãos de apenas um chefe e seus homens que, por vias da força, fecharam os espaços de participação política, a começar pelo Con-

gresso Nacional, estendendo-se às reuniões em praça pública. A censura que impuseram atingiu as raias da loucura, através de atos absurdos, não só contra quem não fosse a favor da ideologia e se
opusesse cara a cara, mas também contra as pessoas inocentes, os lazeres populares e as manifestações artísticas.

Os homens barbudos foram tomados como partidários do comunismo, embora nem todos o fossem. A ditadura usou o expediente capcioso de rotular os adversários como comunistas, para melhor 

atingir objetivos de controle social e estabelecer a ordem imperialista ditada pelos Estados Unidos. Pode-se dizer que a ditadura fez muito mal aos rapazes que apenas cofiavam suas barbas com outros interesses e estavam alienados dos rumos do país.

Esta época, contudo, deixou também, como legado para as novas gerações, atos de coragem, que merecem ser relembrados. É o 36 SEMPRE AOS PARES caso da obra literária Sombras de reis barbudos, de José Jacinto Veiga, que veio a lume na pior hora do regime, bem no início dos anos setenta.


O livro trata da história do menino Lucas e sua gente, numa cidade invadida por uma Companhia de Melhoramentos, que piorava a vida de todos, através de proibições. Em linguagem culta e descontraída, a história logo se tornou motivo de alusões nos meios intelectualizados e uma espécie de senha para a resistência nacional. Mesmo que os estudiosos tenham criado o conceito de fantástico ou realismo mágico, a fim de explicarem algumas referências daquele momento, nem tudo ficou bem explicado e é preciso continuar na militância da memória. A leitura dos anos de chumbo, como se dizia, abre-se em novas conotações neste texto do escritor goiano, conhecido também pelo livro A hora dos ruminantes e pelo fato de ser leitor de Erico Verissimo.

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