Nem tudo que balança cai
Imagino que não seja peculiaridade brasileira, esta sede, esta voracidade por tecnologia, como se a vida fosse impossível sem ela.
Hoje ninguém vai até ali na esquina buscar o pão e o leite a pé, exercitando seus músculos. O carro está aí pra isso. As máquinas, a eletricidade, a eletrônica vieram para nos servir, para facilitar a nossa vida. Depois, quando o médico descobre que seus músculos estão atrofiando, você vai fazer tudo que já poderia estar feito em uma academia (como agora são chamados estes lugares que substituem o exercício que já poderia estar feito), mas na academia, pelo menos, você tem hora certa, paga pelo uso destas outras máquinas, as sucedâneas.
Outro dia, no caixa de um supermercado, a funcionária precisou pesquisar de calculadora na mão qual o resultado de vinte dividido por quatro. Fiquei olhando pasmo para o rosto da garota para ver se descobria algum traço neandertalense, mas não, seu rosto era um rosto comum, igual ao de toda a tribo. Então me lembrei de algo lido não sei quando nem onde e que me pareceu exagero, ou seja, que dia viria em que não haverá mais cérebros que ponham os programas dentro das máquinas. Tanto a memória quanto a capacidade de raciocínio já terão ido para o espaço. Hoje tal afirmação já não
me parece assim tão exagerada.
Mas a mania que mais impressiona é o uso do celular. Um casal de namorados sentados um em frente ao outro no restaurante, os dois olhando para a telinha e movendo os dedos. Estavam conversando pelo zapzap. Para não gastar a voz? Que voz?
Ela também vai aos poucos sumindo de nossa vida. Presumo que mais grave do que esta economia, seja o fato de que as pessoas não conseguem mais firmar o olhar nos olhos de alguém. Essa é uma intimidade que intimida. E pensar que muita gente por aí dá um dedinho para se expor, para que todos vejam como se comporta em todos os momentos da vida, incluindo o que faz e como faz no toalete. Mas encontrar uns olhos, ao vivo, ah, não, isso é muito pesado.
Nada contra o desenvolvimento tecnológico, que, afinal de contas, é irreversível. O canhão destruidor não tem culpa nenhuma, nem o veneno é culpado pelo que faz. É um tremendo clichê, mas às vezes precisamos repeti-lo. O uso é que pode estar errado, isto é, a culpa é de quem usa mal o que nos é oferecido. Os venenos não podem, com a dose e a mistura adequadas, transformar-se em remédio?
Nenhum comentário:
Postar um comentário
http://twitter.com/Menalton_Braff
http://menalton.com.br
http://www.facebook.com/menalton.braff
http://www.facebook.com/menalton.braff.escritor
http://www.facebook.com/menalton.para.crianças