
O texto é lírico, intenso, e a análise do narrador, voltada para a crise existencial mais grave de sua vida, modifica-se com o passar do tempo. Nesse sentido, o estilo narrativo de Menalton nos remete - ao reavaliar o mesmo fato à medida que o protagonista se distancia dele - à série de pinturas de Claude Monet sobre a catedral em Rouen.
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- Fragmento
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DADOS DO LIVRO
Título: Moça com chapéu de palha
Editora: Língua Geral
Ano: 2009
PREÇO: entre R$ 29,00 e R$ 36,00
PONTOS DE VENDA:
COMENTÁRIO
RESENHA COMPLETA
O
título deste romance, Moça com chapéu de palha, antecipa muitos aspectos da
técnica narrativa de Menalton Braff. De imediato, ele sugere uma composição
impressionista, que induz o leitor a participar da criação do significado da
obra.
O
texto é lírico, intenso, e a análise do narrador, voltada para a crise
existencial mais grave de sua vida, modifica-se com o passar do tempo. Nesse
sentido, o estilo narrativo de Menalton nos remete - ao reavaliar o mesmo fato
à medida que o protagonista se distancia dele - à série de pinturas de Claude
Monet sobre a catedral em Rouen.
Este
livro ainda revela muitas cenas campestres, pinceladas como se fossem uma
natureza morta. É quando também há maior abertura para o registro de cenas
cotidianas, triviais, mas que, pela qualidade com que as e os movimentos são
manipulados, ganha um papel muito relevante em Moça com chapéu de palha: elas
completam o papel impressionista, que vai misturar a leveza do erotismo com o
peso da incerteza sobre a vida.
As
impressões nascem ora do que vai sendo mostrado com solidez, o amor entre o
protagonista e Angélica, sua mulher, ora pelas incertezas do narrador em torno
do seu destino. E é justamente em torno das incertezas que o romance ganha um
contraponto, um tom que por vezes, de modo instigante, nos faz lembrar da
literatura noir, repleta de mistérios e suspenses. Acentua-se também um cenário
urbano, da redação do jornal e das relações profissionais ali estabelecidas, da
falta de ética, do poder que consome o compromisso com a verdade, um lema que a
imprensa carrega consigo feito um estandarte.
De
um lado, o campo, o cuidado na preparação da comida, na arrumação da mesa de
jantar, no zelo como jardim, na vida amorosa e sentimental, enquanto, de outro,
estão a cidade e sua máquina incessante, brutal e estressante. Qual dos dois é
mais verdadeiro? Qual dos dois é mais importante? São perguntas que se colocam
neste romance e são formuladas em diálogo com a própria criação literária, num
jogo metalinguístico que apenas um autor maduro como Menalton Braff poderia
conquistar.
FRAGMENTO
"O telefone
ricocheteando pelas paredes do apartamento, muito súbito e sério, com o castigo
deste seu grito estridente, que ele repete obstinado, e repete, acaba esmagando
meus nervos. Minha mão para, atenta, e de minha boca entreaberta escorre um fio
branco de pasta e baba, que a água da torneira carrega para o ralo da pia. É
uma sangria, uma vida que se esvai para fora do tempo. Em geral o telefone não
me aborrece, instrumento de trabalho, mas domingo de manhã, quando estou
escovando os dentes e tenho de fazer um bochecho rápido para ver quem, no
mundo, já está acordado, sinto uma dor que me sobe pela coluna, dor fria que
acaba com meu bom humor. Enquanto saio do banheiro limpando a boca, só não
tenho a certeza do que se trata porque ainda não consegui acordar direito. De
ontem, quase nada além da boca amarga do uísque nacional e uns pedaços de
música na memória de meus ouvidos. Umas duas horas quando saímos da boate. O
resto do dia parece ter sido apagado ou envolto numa bruma cinza. Então o
telefone me lembra o esforço para convencer Ernesto, aquele burocrata retino
que responde pela gráfica, uma criatura estúpida e de imbecilidade crônica,
cruamente engessada em suas normas e procedimentos. Vontade de quebrar seu pescoço
com minhas mãos. Queria a ordem por escrito. Com assinatura, ele gritava
histérico, com assinatura. Mas teu diretor está na Bélgica, grande imbecil, não
está vendo que é impossível? De boca, não, ele berrava, de boca não aceito. E
sacudia a cabeça, o rosto muito vermelho e duas veias descendo grossas por
dentro do pescoço."