sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

NOITE (15)

AMOR E ÓDIO

Pág. 92 - "A rua estava completamente deserta. As lâmpadas davam a impressão de olhos cansados e insones. O Passarinho e o corcunda caminhavam à frente do grupo, de mãos dadas (a menina e o chimpanzé), e de vez em quando o homúnculo atirava os pés no ar, como a dançar um cancã. (...) O Desconhecido caminhava zonzo, sentindo a presença da Ruiva a seu lado, o braço dela enfiado no seu."
(...)
"... procurava trazer até a altura de seus lábios os lábios da rapariga.

- Não! Não! - choramingava ela, negando-lhe a boca, sacudindo a cabeça dum lado para outro.
O anão atacava-a com a fúria dum animal em cio. (...) O Desconhecido sentiu um estremecimento sacudir o corpo da Ruiva.
Por fim o corcunda conseguiu trazer o rosto do Passarinho para junto do seu e beijou-lhe avidamente a boca. A menina, porém, de novo libertou a cabeça, soltou um gemido e começou a cuspir para os lados, com nojo. O anão ergueu a mão e deu-lhe uma bofetada.
Esmagar aquele ratão de esgoto, aquele animal repelente...
O Desconhecido começou a tremer, e todo o ódio, toda a repulsa que sentia pelo corcunda e que tivera de reprimir durante a noite inteira vieram à tona com tal força, que ele se precipitou sobre o nanico, segurou-o  pelos ombros, fê-lo voltar-se com um safanão, e pôs-se a bater-lhe na cara repetidamente, com as palmas e as costas da mão, e quanto mais batia no animal mais gana sentia de bater. E estava já procurando esganá-lo, quando o corcunda fincou-lhe as unhas na cara, à altura dos zigomas, e puxou-as ferozmente face abaixo. (...) Seu joelho direito projetou-se contra o peito do anão, atirando-o de costas sobre a calçada. E ia saltar sobre o ratão para esmagá-lo com os tacos dos sapatos quando o homem da flor passou-lhe o braço em torno do pescoço, puxando-o para trás e cortando-lhe a respiração, ao mesmo tempo que vociferava: 'Idiota! Idiota!'"
(...)
Pág. 94 - "O Desconhecido ofegava. (...) ... enquanto ele ali se deixava ficar inerte, de braços caídos, o corcunda, que se erguera, dava-lhe pontapés nas canelas, agarrava-se-lhe às pernas, procurando mordê-las. O mestre segurou o anão por baixo dos braços e ergueu-o. O homenzinho esperneava, gritava palavrões, cuspia."
"Caminhou para as duas mulheres que estavam abraçadas sob uma lâmpada. A Ruiva tirou da bolsa um lenço e, choramingando também, começou a limpar-lhe o rosto muito de leve, enquanto balbuciava - 'O pobre, o pobre!'
A rua estava ainda deserta. O letreiro de O Vaga-lume apagou-se."
(...)
Pág. 95
"Puseram-se de novo a andar. Na frente iam o mestre e o nanico, seguidos das duas mulheres. O Desconhecido deixara-se ficar um pouco para trás. (...) ... que era que o impedia de fugir e livrar-se de seus carcereiros?"
(...)
"Olhou para trás, como se alguém o tivesse chamado, e avistou um vulto... Não havia a menor dúvida, era o homem da gaitinha." (...) Estou salvo - pensou - estou salvo. (...) A Ruiva, que também fizera alto, gritou-lhe: 'Vem!'
Ele hesitou por um instante entre o homem de branco e a prostituta.
O mestre, porém, tinha voltado sobre os seus passos e agora estava junto dele:
- Que é que há? Não atrase a caravana, homem. Não percebeu ainda que a Ruiva está interessada em você?"
(...)
"- O remédio é dormir com ela."
(...)
"- Que andará fazendo o idiota por aqui a estas horas? - murmurou o mestre.
A Ruiva acercou-se do Desconhecido, tomou-lhe do braço e numa surdina cariciosa cheia de promessas, convidou:
- Vem, amor.
Ele se deixou levar."

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