O texto que segue é um capítulo do livro infantil Melina, ainda inédito. Conta a história de uma jovem abelha insatisfeita com o que faz.
Melina
insatisfeita
Depois
que as campeiras saíram em bando na direção indicada, Melina foi vista
perambulando entre as engenheiras que se dedicavam a construir os favos.
‒
Não fica aí no caminho da gente que você só atrapalha.
Era
uma velha senhora que precisava terminar o último alvéolo de um favo, pois
logo, logo viriam abelhas para regurgitar o mel que seus estômagos estavam
elaborando.
Andando
de cabeça baixa, Melina retirou-se para um ponto em que ninguém estava
trabalhando, a não ser sua amiga Apialina, que estava acabando de fazer a
faxina da entrada da colmeia.
‒
Credo, que ar mais desanimado é esse? ‒ Apialina quis saber.
Melina
nem tinha percebido a presença de sua amiga, então ergueu a cabeça e abriu
muito seus olhos, tanto os dois grandes olhos compostos, como os três olhinhos,
no alto da cabeça.
‒
Ai, que susto! Então é você, Apialina?
‒
Claro que sou eu. Mas você ainda não me disse por que essa cara de desânimo.
Melina
usou as duas patas dianteiras para limpar suas antenas, e procurou uma resposta
à amiga, mas estava muito difícil de encontrar. Apialina juntou um grão de
areia, que mais parecia cocô de uma joaninha e o levou para fora. Em seguida
voltou batendo as patas uma na outra, como se estivesse querendo limpá-las, e
sorriu satisfeita.
‒
Tarefa cumprida ‒ ela disse, pousando de frente para a amiga.
Melina
aproximou-se quanto pôde da companheira porque não queria abelhuda nenhuma,
além de Apialina, envolvida em suas confidências.
‒
Hoje de manhã ‒ ela começou, o corpo todo imóvel, com exceção das mandíbulas ‒
eu saí de campeira. O sol estava agradável e a brisa era fresca. Voei muito,
fui bem longe, até que descobri um angico com mais de trinta metros de altura e
coberto por milhões de flores brancas, branquinhas como neve e carregadas de
pólen. Fiquei emocionada quando vi tudo aquilo: descoberta minha.
Uma
das engenheiras, irritada com aquela conversa que ela não conseguia ouvir
direito, reclamou:
‒ E
vocês duas aí, vão parar de cochichar? Ou então vão cochichar na Cochinchina.
Sem
nada dizer, mas com um gesto de cabeça, Melina convidou sua amiga para saírem
da colmeia. Lá fora não seriam incomodadas por ninguém. Voaram até um galho
velho de um velho cipreste, no extremo do jardim, e pousaram sossegadas. As
abelhas, mesmo das outras colmeias, não usavam aquele lugar como roteiro de
suas viagens. Ali poderiam conversar à vontade.
‒
Voei com pressa para o apiário, mas não com tanta pressa que não viesse
apreciando lá de cima a paisagem: o córrego, as vacas saindo da estrebaria,
depois de cheios os baldes de leite, vespas com cara de quem acabava de
acordar, e uns arbustos com flores de cores lindas, mas fraquinhas de pólen. E
meu coração batia com força, quando eu olhava tudo aquilo e pensava que a
descoberta do angico era minha. Ficava imaginando qual seria a reação da
colmeia.
‒
Mas então, Melina, você tinha motivo era para estar bem alegre.
Melina
ajeitou as asas, os dois pares estremeceram para se soltar melhor. Ergueu os
dois olhos compostos para o céu, aquele mar azul onde ela jamais chegaria, de
tão alto que era, suspirou e confessou:
‒
Pois é, Apialina, não saber por que estou tão pra baixo é que me incomoda.
‒
Então conta o resto, quem sabe juntas nós descobrimos seus motivos.
A
mocinha terminou de engolir um torrãozinho de mel que ainda estava em sua
língua, então continuou.
‒
Quando eu cheguei, logo as operárias todas vieram me rodear porque sentiram o
cheiro da flor do angico, aquela delícia. No meio da roda eu dancei formando um
oito com minhas evoluções, pois o angico fica muito longe, e formei o ângulo
correto em relação ao Sol.
Melina
fez uma pausa, refletindo de olhos abertos.
‒ E
daí? – perguntou Apialina.
‒ E
daí que logo depois chegaram outras campeiras que não tinham encontrado nada
que se aproveitasse em suas viagens e me pediram para repetir as informações.
Dancei outra vez, como tinha feito antes e elas seguiram na mesma direção do
primeiro bando.
O
sol já estava um pouquinho mais quente, não tanto, contudo, que incomodasse as
duas amiguinhas. O velho galho do cipreste velho balançou de leve, movido pela
brisa, que era muito branda.
‒
Ah, já sei ! ‒ gritou Melina, seus olhos arregalados.
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