O autor vem conceituando Literatura e Paraliteratura. E assim prossegue:
Pág. 116 - "A designação de 'literatura popular' torna-se equívoca em virtude da polissemia do lexema 'popular', em cuja amplitude semântica cabem significados e valores de heterogénea e contraditória natureza.
Sob uma perspectiva romântico-tradicionalista, 'literatura popular' significa aquela literatura que exprime, de modo espontâneo e natural, na sua profunda genuinidade, o espírito nacional de um povo, tal como aparece modelado na peculiaridade das suas crenças, dos seus valores tradicionais e do seu viver histórico. 'Literatura popular' contrapõe-se assim a 'literatura de arte' ou 'literatura artística', não se podendo desligar esta antinomia categorial da polémica entre românticos e clássicos.
Numa perspectiva, porém, que denominaremos de romântico-socialista, 'literatura popular' é a literatura que exprime os sentimentos, os problemas e os anseios do povo, entendendo-se por povo a classe social trabalhadora que se contrapõe às classes sociais hegemónicas, detentoras dos meios de produção económica e ideológica e dos mecanismos de dominação política. Por vezes, esta 'literatura popular' é produzida por 'operários que escrevem' - 'artisans qui écrivent', - e que se contrapõem deliberadamente à 'classe letrada', embora apresentando (pág. 117 muitas vezes uma contaminação mais ou menos acentuada com a cultura desta classe, mas é mais frequentemente produzida por autores de origem e condição burguesas que pretendem exercer uma acção pedagógica sobre o povo, no quadro de um projecto utópico-reformista que visa a libertação das classes sociais inferiores - libertação da ignorância, do medo e da injustiça -, a renovação social e a fraternidade humana. assim, por exemplo, Michelet condena 'les publications obscènes ou superstitieuses' e 'une littérature extrêmement subtile, je dirai presque quintessenciée', exaltando em contrapartida um 'teatro imensamente popular' e uma 'literatura popular', forte, jovem e fecunda, que há-de educar e orientar o povo.
Mas antes que se formassem e difundissem o conceito romântico-tradicionalista e o conceito romântico-socialista de 'literatura popular' - o sucedâneo histórico e ideológico deste último será o conceito de 'literatura proletária' -, ambos mitificantes, embora em sentidos divergentes, da entidade denominada 'povo', já existia 'literatura popular', isto é, uma literatura que se dirige a um público semiletrado, desprovido da cultura das classes sociais hegemónicas ou em ascensão - cultura senhorial, cultura clerical, cultura burguesa -, algumas vezes analfabeto, ao qual proporciona entretenimento, realização fictícia de anseios e sentimentos, alguma instrução e informações sobre eventos e personagens históricos ou lendários, sobre fenômenos da natureza, etc. Essa literatura, produzida frequentemente por autores anónimos, vai da poesia lírica à poesia satírica e narrativa, da novela, do conto e do romance ao texto teatral, do livro de devoção religiosa à biografia, da obra didática ao panfleto de índole política ou social e possui, sobretudo a partir do século XVII, em vários países da Europa, os seus peculiares circuitos de produção e distribuição."
(CONTINUA)
Pág. 116 - "A designação de 'literatura popular' torna-se equívoca em virtude da polissemia do lexema 'popular', em cuja amplitude semântica cabem significados e valores de heterogénea e contraditória natureza.
Sob uma perspectiva romântico-tradicionalista, 'literatura popular' significa aquela literatura que exprime, de modo espontâneo e natural, na sua profunda genuinidade, o espírito nacional de um povo, tal como aparece modelado na peculiaridade das suas crenças, dos seus valores tradicionais e do seu viver histórico. 'Literatura popular' contrapõe-se assim a 'literatura de arte' ou 'literatura artística', não se podendo desligar esta antinomia categorial da polémica entre românticos e clássicos.
Numa perspectiva, porém, que denominaremos de romântico-socialista, 'literatura popular' é a literatura que exprime os sentimentos, os problemas e os anseios do povo, entendendo-se por povo a classe social trabalhadora que se contrapõe às classes sociais hegemónicas, detentoras dos meios de produção económica e ideológica e dos mecanismos de dominação política. Por vezes, esta 'literatura popular' é produzida por 'operários que escrevem' - 'artisans qui écrivent', - e que se contrapõem deliberadamente à 'classe letrada', embora apresentando (pág. 117 muitas vezes uma contaminação mais ou menos acentuada com a cultura desta classe, mas é mais frequentemente produzida por autores de origem e condição burguesas que pretendem exercer uma acção pedagógica sobre o povo, no quadro de um projecto utópico-reformista que visa a libertação das classes sociais inferiores - libertação da ignorância, do medo e da injustiça -, a renovação social e a fraternidade humana. assim, por exemplo, Michelet condena 'les publications obscènes ou superstitieuses' e 'une littérature extrêmement subtile, je dirai presque quintessenciée', exaltando em contrapartida um 'teatro imensamente popular' e uma 'literatura popular', forte, jovem e fecunda, que há-de educar e orientar o povo.
Mas antes que se formassem e difundissem o conceito romântico-tradicionalista e o conceito romântico-socialista de 'literatura popular' - o sucedâneo histórico e ideológico deste último será o conceito de 'literatura proletária' -, ambos mitificantes, embora em sentidos divergentes, da entidade denominada 'povo', já existia 'literatura popular', isto é, uma literatura que se dirige a um público semiletrado, desprovido da cultura das classes sociais hegemónicas ou em ascensão - cultura senhorial, cultura clerical, cultura burguesa -, algumas vezes analfabeto, ao qual proporciona entretenimento, realização fictícia de anseios e sentimentos, alguma instrução e informações sobre eventos e personagens históricos ou lendários, sobre fenômenos da natureza, etc. Essa literatura, produzida frequentemente por autores anónimos, vai da poesia lírica à poesia satírica e narrativa, da novela, do conto e do romance ao texto teatral, do livro de devoção religiosa à biografia, da obra didática ao panfleto de índole política ou social e possui, sobretudo a partir do século XVII, em vários países da Europa, os seus peculiares circuitos de produção e distribuição."
(CONTINUA)
Olá Menalton
ResponderExcluirPara ampliar a discussão sobre literatura popular, recomendo a leitura de "Cultura no plural", de Michel de Certeau. Sobretudo o texto "A beleza do morto".
(http://books.google.com.br/books?id=DviePWAbSuAC&printsec=frontcover&hl=pt-BR&source=gbs_ge_summary_r&cad=0#v=onepage&q&f=false)
Abraço
Obrigado, Tais. Dia 15 continua.
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