domingo, 7 de julho de 2013

FRAGMENTO DE UM ROMANCE JUVENIL

O fragmento abaixo é  do romance juvenil Copo vazio, editado pela FTD em 2010.
Fora de perigo
Nesta cidade, notícia é carregada pelo vento. Não contei pra ninguém o que se passou com a coroa hoje à tarde, e agora está esta turma toda aqui perguntando então, como é que ela está? O Eduardo adivinhou e a turma dele veio junto. A Silvinha não me larga, o que não me incomoda nem um pouco. A noite está quente, mas não tão quente como a chaveirinho grudada no meu braço.


Eu tinha acabado de levar o suco gelado de maracujá quando eles chegaram. Minha mãe jantou muito pouco e reclamou com sua voz doente que sentia mais era sede. O médico recomendou que ela ficasse o resto do dia na cama porque a coroa estava muito fraca. Com as batidas à porta, ela se apressou:

-- Pode dizer que estou dormindo, ouviu? Não quero ver ninguém hoje.

A voz dela ainda lembrava o cheiro de nenê babando no próprio dedo. E dizendo isso, ela encolheu-se um pouco e começou a dormir ali mesmo, naquele instante. Minha mãe se sente muito nova para ser velha, mas às vezes ela quer descansar. E descansa. Ela diz que está dormindo e não é mentira.

A luz da varanda está apagada pra não chamar besouro. O Eduardo foi quem disse:

-- Não, Júlio, deixa esse trem apagado porque senão isso aqui vai encher de besouro.

Os outros também pressionaram: melhor é ficar no escuro. E o escuro, eu sei, tem suas vantagens. No escuro, a gente sabe dizer tudo muito melhor, e, quando tem de rir, o riso vem do fundo, se soltando, subindo, até ser uma cachoeira, de tamanha força. Ninguém vê direito a cara uns dos outros, por isso o som, apesar do escuro, se torna mais claro, porque vira música, ele é cantado.

Eles perguntam e eu respondo com a voz meio enterrada nos cabelos da Silvinha, seu cheiro excitante. Sim, está passando bem, mas precisa descansar. Só pode sair da cama amanhã, e olha lá, cuidando bem do corpo. Esse cheiro. Mas eu conheço esse cheiro. São os dois garotos sentados na mureta perto da parede. As duas sombras paradas, sei que são eles. Eles perguntando e eu respondendo, só que agora não perco mais os dois, pois ninguém vê o que estou observando. Agora é a Raquel. Leva as duas mãos à boca e chupa, chupa com sua vontade de engolir o mundo todo de uma vez. No oco das mãos juntas, a brasinha vermelha ilumina por dentro o balão. O Eduardo pula e passa o toco do baseado para o Walmir, que está do lado dele. Explico que o soro e a glicose, coisas que há muito já conheço, e eles me perguntam e eu respondo, sem me distrair da observação.

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