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Tudo trocado
Com uma distribuição melhor dos serviços, ninguém mais vai precisar perder mais de uma hora numa fila de correio
Como ao longo da vida tenho feito sozinho minhas análises, não por preconceito contra analistas, mas por falta de dinheiro mesmo, comecei outro dia a examinar todas as minhas paranoias para descobrir por que, de todas as minhas sugestões, nenhuma foi jamais posta em prática por quem de dever. Vasculhei no fundo do baú, no sótão e nos sonhos.
Como não descobri nada até agora, isto é, até agora não descobri ninguém me perseguindo, nenhum complô contra mim, continuo com minhas sugestões. Que não me custam nada nem são levadas a sério por quem quer que seja. Quem sabe no futuro, um futuro muito remoto, alguém se lembre de dizer que “ele foi um incompreendido em sua época, coitado, pois vivia cinquenta anos à frente de seu tempo”.
Não é assim que se consagram postumamente os gênios? Então serei consagrado por causa de minhas sugestões. Um exemplo de louco genial? O Santos Dumont, disse que voava e voou.
Minha mulher foi mandar um livro meu para um amigo nosso. Essas coisas costumam-se fazer numa agência da EBCT. Acho que o nome ainda não mudou. A obrigação era minha, mas ela deveria passar pela frente do correio e gentilmente se prontificou a fazer a postagem.
Coitada, ficou cerca de sessenta e cinco minutos na fila. Sessenta e cinco contadinhos no relógio. Para enviar um livro que nem Face tampouco telefone teriam competência de levar ao destino. À sua frente, alguém trazia as contas de luz e água de toda a rua onde mora. Era preciso conferir aquela papelada toda.
Um outro receberia sua aposentadoria, mas havia algum erro em sua documentação, e ele declarava para que todos ouvissem que não arredava dali sem os caraminguás do mês. Havia mais, gente sonhando com as riquezas escondidas dentro de certo baú. E mais, muito mais. Uma mocinha recém-demitida pelo noivo, à falta de ouvidos disponíveis, queria apenas se confessar ao caixa, e ambos debulharam-se em lágrimas.
Ora, se a EBCT serve para tanta coisa, por que não distribuir melhor os serviços? Pois aí vai minha sugestão, que hoje pode parecer absurda, mas em pouco tempo, quando e se aceita, dirão que li o futuro que ninguém enxergava. No banco, reservar um caixa apenas para o recebimento de cartas e encomendas.
Os supermercados, por exemplo, que costumam manter em seus quadros de funcionários um verdadeiro exército de caixas, por que não os aproveitam para a quitação de duplicatas e o pagamento de aposentadorias?
Com uma distribuição melhor dos serviços, ninguém mais vai precisar perder mais de uma hora numa fila de correio.
Blog de Literatura do escritor Menalton Braff, autor de 26 livros e vencedor do Prêmio Jabuti 2000.
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segunda-feira, 31 de agosto de 2015
CARTA CAPITAL| TUDO TROCADO
Postado por
Anônimo
às
05:53
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