segunda-feira, 23 de novembro de 2015

CARTA CAPITAL| CAFÉ FILOSÓFICO


Café filosófico

Interromper um debate para se autopromover não é só falta de respeito com o autor convidado, mas também uma forma de mostrar deficiência cultural

Nem sempre se consegue estar atualizado, conhecendo tudo que acontece ao redor da gente. Já nem se pode falar de inteiramente atualizado porque isso é impossível. Principalmente neste que passou a ser chamado de o século da informação. Não só em feiras de livros, mas também nelas, tem-se ouvido muito falar em Café Filosófico, Salão de Ideias, Café Literário, tudo mais ou menos com o mesmo formato, mas algumas pessoas conseguem ver apenas um microfone aberto e uma oportunidade de se expressar. A coisa não é bem assim. Há diferenças entre os encontros de propósitos científico-culturais, de acordo com os objetivos de cada um. 

Corro o risco de ser acusado de ter produzido uma crônica didática, mas ela, em que pese a chatice, me parece necessária. Tenho visto muito equívoco envolvendo o assunto, aqui e acolá. Não que seja um especialista na área, mas aprendi que conferência não é palestra, tampouco palestra é aula e por aí em frente.

O Salão de Ideias é o espaço da interação autor/leitor. Dúvidas, observações, talvez até contestações cabem no Salão de Ideias. Dizem aqueles que conhecem sua gênese melhor do que eu que o Salão de Ideias foi uma criação da Câmara Brasileira do Livro para designar o evento em que, apresentado um autor, o público praticamente conduz a conversa de conformidade com sua curiosidade, de acordo com aquilo que deseja esclarecer. Um amigo meu chega a afirmar que só a CBL tem o direito de usar tal nome. 

O Café Filosófico, originariamente, acontecia em um café na situação de informalidade que lhe é peculiar. Convidava-se alguém cuja assinatura aparecesse em algumas publicações, para esclarecer seus pontos de vista, para expor suas ideias a respeito de algum assunto de sua área. O autor fala, a plateia ouve. Só no final, as pessoas podem tirar suas dúvidas. Em resumo, o encontro tem um tema previamente definido. O Café Literário, por suposto, teria o mesmo formato do filosófico, mas com a literatura como matéria da exposição. 

O que mais se vê, entretanto, é que o evento receba qualquer um dos títulos, sem nenhum critério. Pior ainda: é muito comum a intervenção de pessoas da plateia que, descobrindo um microfone, passam a encantar o público com teses políticas, exercícios filosóficos, homenagens ao autor, leitura de “pequeno texto de minha própria lavra”. O autor, aquele que atraiu o público por causa de sua obra, esse fica na constrangedora posição de plateia, mantendo, geralmente, um silêncio respeitoso em face do intruso.

A autopromoção, num momento desses, não é só falta de respeito em relação ao convidado, é também uma maneira de demonstrar deficiência cultural.

Se abordei esse assunto, foi porque ontem meu amigo Adamastor, tomando um cafezinho aqui em casa comigo, de repente afirmou, Ah, isso é tudo a mesma coisa. “Tudo a mesma coisa” é o que resulta numa geleia geral, num sincretismo cultural em que se perdem as noções de valores.

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