ENCANTO
(Regina Baptista*)
(Regina Baptista*)
A
ideia de tatuar no corpo o nome de Rosana surgiu como fruto de um desespero.
Ele só descobriria isso ao folhear a lista telefônica em busca de um tatuador.
Mesmo assim os dedos e os olhos continuaram na busca: “Talvez seja melhor, ao
invés do nome, tatuar uma rosa... como se a rosa derivasse de Rosana”. Quis
imaginar-se com uma rosa no corpo, mas onde? No peito? No braço? Pensou num
lugar que ficasse oculto de todos. Numa das pernas? Não... Seria melhor tatuar
nas costas, na altura dos ombros. Assim, ele não precisaria vê-la toda vez que
tirasse a roupa, embora sempre soubesse da existência da rosa ali, soberana,
imponente, viva...
E por que não
deveria vê-la?...
Empurrou a
lista telefônica como se ela zombasse dele. Quis chorar. A rosa se tornava aos
poucos mais uma tentativa vã de exorcizar Rosana de seu pensamento.
E além disso,
como explicaria sobre a rosa às mulheres
que o vissem despido? Por um lado, seria
uma precaução contra a esperança. Elas descobririam de imediato o significado
da tatuagem: uma marca! um registro! Uma declaração de que ele não é de
ninguém! Um aviso de que ele não quer ser de ninguém. Pois a rosa já o detém...
Mas por outro lado, seria tão cruel! As mulheres que conheceram a desilusão por
amá-lo, só suportaram a perda porque descobriram lentamente os seus segredos.
A violência de
ver estampada na sua pele a memória de um amor antigo seria cruel ou, no
mínimo, desconcertante.
Ora! As
amantes... Por que precisariam saber sobre a tatuagem? Por que ele teria que
lhes contar? Bastaria dizer: “ela me perfuma, me faz sentir encantado”. E mesmo
assim não estaria mentindo porque a lembrança de Rosana doía com encanto sim. O
encanto de um romance que se perdeu sem que para isso houvesse turbulência nos
espíritos de ambos. Frases curtas e silêncios longos se encarregaram de pôr fim
aos sonhos. Agora, amadurecido, ele se alivia só com a ideia de que o final que
o condenou a uma vida boêmia e promíscua fora ao menos suave. Alivia-se que
para antídoto, ao menos num breve instante, basta a imagem de uma rosa.
Ao
menos nesse instante não olhará pela janela do apartamento e verá o céu
despencar sobre a cidade. Nem correrá ao telefone para combinar um encontro com
o atual flerte, na ânsia de descarregar a força reprimida da paixão. Nem velará
os murmúrios da namorada atestando sua sedução, que já o confunde ao invés de
envaidecê-lo. Ele já está, aliás, prestes a ignorar qualquer poder que possam
lhe atribuir. Está a ponto de desejar ser apenas um romântico.
Uma
rosa... é preciso ter uma rosa em mãos para poder saber dela o que poderá ser
impresso na sua pele. Felizmente a diarista, por algum motivo, brindou o fim da
faxina com um botão de rosa no vasinho da sala de estar. Ele não a tinha visto.
Agora que busca uma rosa, sente-se premiado com o arranjo da empregada. “Uma
rosa!” Ele a retira do vasinho com todo cuidado, como se fosse de cristal
finíssimo, vulnerável. É preciso encará-la. “Como você ficará em mim? Como você
ficará na minha pele?”.
Ele
vai ao espelho, arranca a camiseta. Aproxima do peito a rosa cor de maçã.
“Ficaria linda aqui, perto do coração”.
O toque das pétalas na pele faz o corpo todo arrepiar. Que lembrança
terrível!... No último encontro com Rosana, ela também repousara sua cabecinha
no peito dele. E esse gesto o fizera entender que ela estaria para sempre ali,
pois desejava o abrigo dele para sempre. No entanto... alguns dias depois desse
gesto, ela revelara que estava de partida. Não dava mais para continuar.
A
rosa, como que compreendendo seu destino de fracasso, abandona o peito e cai no
chão. Ele a encara de cima como um deus e sentencia: “Você não vai embora”.
*Regina Baptista - Escritora
Nasceu em São Joaquim da Barra-SP, aos 16 de junho de 1968.
Mora em Ribeirão Preto desde 1977.
Graduada em Ciências Sociais pela UNESP, de Araraquara-SP,
em 1995.
Trabalha como secretária paroquial na Arquidiocese de
Ribeirão Preto, desde 1997.
Filiada à UBE – União Brasileira de Escritores desde 2010.
LIVROS PUBLICADOS (de forma independente):
CÁRCERE PRIVADO (2007) – novela – Ed. Scortecci
O narrador está preso num cativeiro, sem contato com seus
opressores. Apenas uma mulher, Iolanda, o visita diariamente para levar as
refeições e limpar o lugar. Entre uma conversa e outra com sua “carcereira”, o
narrador vive devaneios e delírios por causa do confinamento.
MUNDO SUSPENSO (2009) – microcontos e outros textos breves –
Ed Scortecci
Nesse livrinho as narrativas são breves e compactas,
tentando sempre potencializar um acontecimento cotidiano.
ATO PENITENCIAL (2011) – romance – Editora Coruja
Partindo do mito de Fausto, o livro tenta mostrar um
conflito faustiano de um sacerdote católico que seguiu a trajetória religiosa
abdicando à sua verdadeira vocação humanista (Ciência), em nome de uma culpa do
passado: a morte do pai. Na condução do seu trabalho religioso os fantasmas
desse passado nunca dão descanso. Até que um dia surge um jovem, Asmodeu,
fazendo provocações sedutoras.
REVISTA MASCULINA-O HOMEM EXPOSTO (2012) – contos – edição
própria.
Nessa coletânea foi selecionada uma parte dos textos
dedicados ao universo masculino, destinados a uma coletânea maior. São cinco textos em forma de diálogos entre
dois personagens: dois homens ou um homem e uma mulher.
FÓRUM VIRTUAL (2015) – romance – Editora Redemoinho
Seguindo a linguagem de diálogos (como já havia feito em
Revista Masculina), o texto narra episódios virtuais, como a emissão de e-mails
e s discussões em fóruns virtuais. Todas as discussões dizem respeito a uma
matéria de revista. A personagem Ana Débora, jornalista bem conceituada, é a
autora da matéria e é através das suas investigações na Internet que ela
descobre discussões de internautas, em diversas épocas, impactados com sua
matéria.
PARTICIPAÇÃO EM ANTOLOGIAS:
1 – Elo de Palavras (2008) – Ed. Scortecci – com o conto
BETH E FRED
2 – Tantas Palavras (2011) – com o conto CABINE DE COMANDO
3 – Antologia UBE (2015) – Ed. Global – com o conto
OUTSIDERS
OBRAS INÉDITAS:
Contos: – ENTRE A
VIDA E A MORTE – UM DOSSIÊ MÉDICO – OS FILHOS DE CAIM – REVISTA MASCULINA
(primeira parte publicada em 2012)
Romances: – POÊNIA – EXERCITO PARTICULAR – O FILHO
(inacabado) – AS TORRES (inacabado) – DIÁRIO DE UM NEURÓTICO – A POLÍTICA
SEGUNDO DANI SCARPINI – A PERFORMANCE
link para contato: e-mail (reginabaptista@ig.com.br) tenho
também um blog : http://reginabaptistacronos.blogspot.com.br
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