sexta-feira, 5 de maio de 2017

CONTOS CORRENTES

A morte da pomba                                                           
(Antonio Perucello Ventura*)

     No meio da praça, durante o maior festival da cidade, um tiro soou ao longe. A festa parou, todos amedrontados, até que uma gorda pompa caiu morta dos céus. Ao verem isso, a festa continuou, ninguém prestou atenção ou mesmo se importou com a ave morta.
      Depois de mais algumas horas da festa, mais dois tiros foram ouvidos, mas, desta vez, uma mulher de idade já avançada caiu no meio da multidão, com dois buracos de bala no tórax e uma criança chorava em seus braços. Todos correram para levar o menino ao hospital, já a velha, ferida e fraca, deixaram para morrer ao lado da pomba.

       Foi essa a impressão que Léo Tamanduá levou para o resto da vida. Se você não atende às expectativas da sociedade, você não vale mais que uma pomba.
       O Tamanduá recebeu esse nome graças à uma deformidade no rosto, que levava o nariz a ser muito grande, como de um tamanduá.
       Léo Tamanduá nunca foi bom em nenhuma matéria escolar, era retardado e inútil no trabalho em grupo. Descobriu-se, aos 6 anos, que tinha uma anomalia na cabeça que não o deixava concentrar-se e aprender com eficiência. Mesmo assim, com medo de ser rejeitado pela sociedade,   estudava muito e fazia seu melhor. Tudo isso não resulta em muita coisa. Aos 8 anos, foi deixado sozinho em um quarto onde tropeçou em um brinquedo, quebrando uma vértebra, o que o deixou corcunda. A vida de Léo era um desastre, até que um dia, enquanto assistia à televisão, viu uma coisa que mudaria sua vida: um comercial de um programa espacial. Ao ver aquilo deu pulos de alegria! Aquele objeto imenso, rodeado por placas de metal era solto para voar como um pássaro e chegar à Lua; lá não haveria ninguém para julgá-lo. Léo Tamanduá trabalhou dia e noite com tudo que falavam na TV e nas revistas. Depois de muito tempo, conseguiu construir um mini planador que ele acreditava ir até a Lua. Porém, antes de tentar a sua criação foi até uma loja de ferramentas fazer os últimos reparos em sua invenção, quando viu uma garota. Esta garota não era muito bonita, mas Léo a achou espetacular. Passa a segui-la dia e noite. Até que um dia, com medo do perseguidor, a garota virou-se para ele dizendo que se chegasse mais perto, ela teria de chamar a polícia. Léo se encantou com isso, em sua inocência a garota estava tentando protegê-lo. Ele estava louco para mostrar-lhe sua primeira invenção. Correu para sua casa e pegou os apetrechos, subiu no prédio mais alto e gritou:
-Se valho como uma pomba, então serei uma.
E pulou...
Ninguém estava ali para ampará-lo ou segurá-lo, nem mesmo a garota.
Conta-se que a alma de Léo alcançou a Lua, porém seu corpo não passou do asfalto.

* (O autor escreveu este conto com pouco mais de dez anos. Ele é filho do poeta Antonio Ventura e da poeta Débora Ventura.)

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