(Virgínia Finzetto)

compras, mas, quando me viro em direção ao meu carro, vejo a viatura da polícia queimando os quatro pneus na brusca parada bem em cima da minha Brasília. Largo tudo e coloco as mãos na
cabeça, ao ver que desceram dois policiais com armas apontadas para mim. O susto foi tão grande que quase desfaleço, porque, se eles tivessem amassado a minha caranga, eu teria que arcar com aquele preju sozinha. Enquanto pensava sobre a sorte de meu carro não ter sofrido nenhum dano, um dos policiais, como é de praxe, pediu minha habilitação e os documentos do veículo. Eu entreguei tudo e, assim que eles confirmaram o equívoco, me liberaram. Entro no carro e fico ali sentada por
alguns minutos tentando recuperar meus sentidos. Fui embora com o coração ainda disparado de tanta emoção. Depois de andar mais alguns metros adiante, eu vejo novamente a polícia, a mesma que havia me abordado, apontando armas agora para um sujeito, o mesmo que havia me roubado. Ele,
com as mãos na cabeça, e uma sacola no chão, ao seu lado. Ahhhhh...pensei, maldito bandido, conseguiu fugir levando uma de minhas sacolas! Imediatamente parei o carro e fui lá tirar satisfação. Os policiais, reconhecendo a Brasília amarela começaram a discutir entre si, ora apontando a arma para o bandido, ora para mim, porque desconfiaram que EU, que reaparecera para eles, fosse cúmplice do larápio. Depois de muitas explicações, consegui convencê-los de que EU era a vítima, e que havia parado ali exatamente para recuperar o resto das minhas compras, ou seja, a sacola que estava ali bonitinha no chão. Resumo da ópera: das 10 sacolas de compra, exatamente NAQUELA é que estava o bilhete de loteria, ainda com o troco! No dia seguinte saiu o resultado, e eu havia feito a quina sozinha. Quase enfartei! Demorei muito a me recuperar do susto. Perdi o sono, já não comia mais, tamanha a ansiedade e o temor que tomaram meu corpo e minha alma. Durante um tempão fiquei com o bilhete, olhando toda hora para ele, conferindo os números no resultado do recorte do jornal e guardando em seguida o bilhete em um lugar seguro. Repetia esse ritual quase que diariamente, só pensando no que deveria fazer. O prêmio era muito alto, iria mudar radicalmente minha vida. E eu me perguntava se estava preparada para isso. Até que um dia, decidi ir resgatar o prêmio, assim de supetão, como quem não quer nada. Estacionei minha Brasília amarela bem em frente à Caixa Econômica Federal, desci firme e resoluta, com a bolsa a tiracolo, quando, ao olhar para a esquerda, vejo um sujeito se aproximando a passos largos em minha direção. Mas, assim que eu o reconheci como sendo o mesmo ladrão, aquele que havia roubado minhas compras do carro há meses com o bilhete que estava na última sacola que eu recuperara, ele deu um puxão com muita força na minha bolsa e fugiu com ela em disparada. Nessa hora, não havia nenhum policial por perto, não havia nenhuma viatura em alta velocidade e não houve nenhum déjà vu. Só havia meu coração colapsado. Só havia o eu que nunca mais se recuperou desse episódio. Moral real desse meu conto imaginário: um raio não cai no mesmo lugar, mas pode infernizar a vida de uma mesma pessoa por várias encarnações.
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