PÉ NA ESTRADA
Por força da participação em alguns projetos culturais, andei visitando uns pares de cidades das mais variadas estaturas. Para gáudio deste escrevinhador, em cidades, por pequenas que sejam, há sempre uma biblioteca, muito boas algumas, apenas mais ou menos outras, e algumas bem ruinzinhas, mas de qualquer forma utilizáveis.
Na minha infância e adolescência, depois de consumir todos os livros consumíveis de meu pai, de sua pequena biblioteca, ele, meu pai, me salvou levando-me a uma biblioteca pública. Você, caro leitor, já se sentiu entrando no paraíso? Eu já. Nunca mais abandonei o hábito de frequentar bibliotecas, pelo menos enquanto não era financeiramente capaz. Hoje já posso dizer que a minha, aqui dentro da minha casa, satisfaz quase todas as minhas necessidades.
Bem, fiz essa pequena digressão autobiográfica, para justificar ou, pelo menos, explicar meu apreço pelas bibliotecas públicas, principalmente as que são mantidas pelos municípios. Há muito que melhorar nelas, admito, sobretudo no que diz respeito à renovação de acervo. Em geral elas ficam anos e anos sem receber um único livro e algumas ficam trancadas para que não se estraguem os livros. Mas se existem, alguém vai furar o bloqueio e, sorrateiramente, vai penetrar naquele recinto mágico.
O assunto me faz lembrar de uma biblioteca escolar, que já é outro departamento. Em visita a uma escola, pedi à diretora que me mostrasse a biblioteca (é uma mania que tenho). Ela foi buscar a chave e me ordenou que a acompanhasse. Escura, trancada, e empoeirada. Foi assim que a encontramos.
Perguntei por que aquele cheiro de mofo, e a distinta me afirmou que mantinha a biblioteca trancada para que os alunos não sujassem nem estragassem os livros. Pobres livros mudos!, pensei eu. Sem serventia. Livros amordaçados.
Neste capítulo das bibliotecas públicas municipais, minha grande decepção foi descobrir que em uma cidade com mais de quinhentos mil habitantes, além de duas bibliotecas de instituições privadas, ambas passando por sérias dificuldades para se manterem, fui encontrar uma biblioteca escondida, quase um porão, sem nada que a faça conhecida, com um acervo pobre, enfim, bem mais pobre que congêneres de cidades de trinta mil habitantes.
Então fico pensando: Os agentes públicos, aqueles de quem depende a vida de uma cidade, acham que desenvolvimento só existe para a economia. Ah, e esporte. Claro, isso além de calçamento de ruas e abastecimento de água. Tentando entender: autoridades políticas em uma democracia são eleitas pelo voto popular. Certo? E como não lhes interessa voltar à condição de cidadãos comuns, sem cargo público, só fazem aquilo que lhes trouxer votos.
Livro dá cultura. Livro não dá voto.
Blog de Literatura do escritor Menalton Braff, autor de 26 livros e vencedor do Prêmio Jabuti 2000.
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segunda-feira, 14 de maio de 2018
CARTAS DO INTERIOR
Postado por
Anônimo
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07:05
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Triste realidade
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