quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

GRANDE SERTÃO: VEREDAS (17)

HERMÓGENES, O CÃO

O bando liderado por Zé Bebelo, de que fazem parte Riobaldo e Diadorim, está cercado pelos homens de Hermógenes em uma fazenda abandonada. Os hermógenes são em maior número e não há como romper o cerco nem há como invadir a casa onde estão abrigados os zebebelos. O impasse.
Riobaldo continua com suas preocupações metafísicas. Imagina que Hermógenes tenha feito pacto com o demônio.

Pág. 328 - "E se eu quiser fazer outro pacto, com Deus mesmo - posso? - então não desmancha na rás tudo o que em antes se passou?  (...) Neste mundo tem maus e bons - todo grau de pessoa. Mas, então, todos são maus. Mas, mais então, todos não serão bons? Ah, para o prazer e para ser feliz, é que é preciso a gente saber tudo, formar, alma, na consciência; para penar, não se carece: bicho tem dor, e sofre sem saber mais porque. Digo ao senhor: tudo é pacto. Todo caminha da gente é resvaloso."
Mesmo debaixo de tiroreio, Riobaldo continuava com sua estranha atração por Diadorim:
Pág. 332 - "De Diadorim não me apartava. Cobiçasse de comer e beber os sobejos dele, queria pôr a mão onde ele tinha pegado. Pois, por que? Eu estava calado e estava quieto. Eu estremecia sem tremer. Porque eu desconfiava mesmo de mim, não queria existir em tenção soez. Eu não dizia nada, não tinha coragem. O que tinha era uma esperança?  Mesmo parava tempos no pensar numa mulher achada: Nhorinhá, a minha mnoça Rosa'uarda, aquela mocinha Miosótis. Mas o mundo falava, e em mim tonoto sonho se desmanchando, que se esfiapa com o subir do sol, feito neblina noruega movente no frio de agosto."
Vem uma extensa lista de companheiros com suas características e sonhos:
Pág. 335 - "... o Quêque, que sempre tinha saudade de sua rocinha antiga, desejo dele era tornar a ter um pedacinho de terra plantadeira; (...) o Acauã, um roxo esquipático, só de olhar para ele se via o vulto da guerra; (...) o Conceiço, guardava numa sacola todo retrato de mulher que ia achando, até recortado de folhinha ou de jornal; (...) o Fafafa, sempre cheirando suor de cavalo, se deitava no chão e o cavalo vinha cheirar a cara dele; ..."
E o tiroteio continua:
Pág. 341 - "Achei especial o jeito de João Concriz vir, ansiado cauteloso. Ação em que qualquer um anda - nessas semeolhantes ocasiões - só encostado nas paredes. -'Você fica aqui, mais você, e você... Você dessa banda... Você ali, você-aí acolá...' - arrumação ele ordenava. -'Riobando, tatarana: tu toma conta desta janela... Daqui não sai, nem relaxa, por via nenhuma."
Pág. 342 - "Sei que o cristão não se concerta pela má vida levável, mas sim porém sucinto pela boa morte - ao que a morte é o sobreviver de Deus, entornadamente..
Atirei. Atiravam.
Isso não é isto?
Nonada."
Pág. 343 - "A aragem. Diadorim onde estivessse? soube que ele para em outro ponto, em seu posto em praza. Sustentava, picando alvos a para a frente, junto com o Fafafa, o Marruaz, Guima e Cavalcênti, na barra da varanda. Todo lugar não era lugar? Não se podendo esbarrar, de jeito nenhum, no arrebentar, nas manivelas da guerra. "
(...)
"Aquela guerra ia durar a v ida inteira? O que eu atirava, ouvia menos. Mas os dois outros: assovios bravos, o achispe, isto de ferro - as balas apedrejadas. Eu e eu. Até meus estalos, que a cada, no próprio do coração. À mira de enviar um grão de morte acertado naquelas raras fumaças dansáveis. Assim é que é, assim."
E voltam as desconfianças de Riobaldo em relação a Zé Bebelo.
Pág. 346 - "Aquele tinha sido homem pago estipendiado pelo Governo, agora os soldados do Governo com ele se encontravam. E nós, todos?"
Pág. 347 - "'Traição?' - eu não queria pensar. Eu já tinha preenchido três cartas."
Trata-se das cartas ditadas por Zé Bebelo chamando as forças do governo.  O pensamento do jagunço Riobaldo não para.
Pág. 349 - "Nã9o nas artes que produzia, mas no armar de falar assim - ele era razoável. Se riu, qual. Riu? Eu sendo água, me bebeu; eu sendo capim, me pisou; e me ressoprou, eu sendo cinza. Ah, não! Então, eu estava ali, em chão, em a-cú acôo de acuado?!"
Riobaldo, bom de mira, vai fazendo as contas daqueles que atinge:
Pág. 352 - "Fiz conta: uns seis, sei, até a hora do almoço - meia-dúzia."
De repente a notícia explode dentro da casa: os hermógenes começaram a atirar nos cavalos do grupo de Zé Bebelo.
Pág. 356 - "-'Os mais maoditos! Os desgraçados!'
O fafafa chorava. João Vaqueiro chorava. Como a gente toda tirava lágrimas. Não se podia ter mão naquela malvadez, não havia remédio. Á tala, eles, os hermógenes, matavam conforme queriam, a matança, por arruinar. Atiravam até no gado, alheio, nos bois e vacas, tão mansos, que, desde o começo, tinham querido vir por se proteger mais perto da casa. Onde se via, os animais iam amontoando, mal morridos, os nossos cavalos! Agora comçávamos a tremer. Onde olhar e ouvir a coisa inventada mais triste, o terrível - por no escasso do tempo não caber. A cerca era alta, eles não tiveram fuga. (...) A gente juravas vinganças. E, aí, não se divulgava mais cavalo correndo, todos tinham sido distribuídos derrubados."
E completa com uma reflexão:
Pág. 359 - " E nisto, que conto ao senhor, se vê o sertão do mundo. Que Deus existe, sim, devagarinho, depressa. Ele existe - mas quase só por intermédio da ação das pessoas: de bons e maus. Coisas imensas no mundo. O grande-sertão é a forte arma. Deus é um gatilho?"


















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