sábado, 25 de fevereiro de 2012

NOITE (23)

NINGUÉM SE DESFAZ DO PASSADO

As recordações continuam interferindo no presente.

Pág. 118 - "Raros autos e ônibus rolam sobre o asfalto da grande avenida. (...) Mais duas quadras e chegará à casa... Pulsa-lhe o coração com descompassada força."
"Para. É melhor esperar, pôr ordem nas ideias, acalmar-se."

Pág. 119 - "O perfume que vinha da mulher parecia aumentar-lhe a inibição, sugeria-lhe algo vagamente proibido, tinha uma qualidade fria, asséptica, assexuada. No entanto os seios dela eram empinados e rijos, arfavam de desejo. (Isso o irritava como uma impertinência.)"
Pág. 120 - "Voltou para o quarto e aproximou-se da cama, junto da qual a mulher o esperava de pé, os braços estendisos: 'Vem, meu amor'.
Como podia falar e portar-se com tanta naturalidade? Tinham tido um noivado curto, sem maiores intimidades. Ele não podia deixar de achar vagamente indecoroso aquele convite tão claro ao ato sexual."
(...)
"(Ele tinha dezessete anos e caminhava agoniado pelo beco sombrio. As máscaras nas janelas ... O pó de arroz tornava cinzentas as caras das mulatas. Havia também mulheres b rancas. Uma cabocla de dente de ouro convidou: 'Entra, amoreco'. (...) Ele sentia a quente palpitação do sexo, o alvorotado pulsar do coração, e num minuto de estonteamento pareceu que o sexo lhe subia ao peito, batia contra as costelas e depois, intumescido e furioso, ficava a martelar-lhe as fontes."
Pág. 121 - "'Vem, franguinho!' Entro? Não entro. Entro? Não entro. Esta não. A outra. Mais adiante..."(...) Ele estacou, olhou para a mulher gorda de cara fammiliar, hesitou por um instante, e entrou. (...) Uma lamparina lucilava junto da cama. (...) 'Vem duma vez, menino' Ele fez meia volta e correu para a porta.)
- Vem... - insistiu a noiva. Ele permaneceu calado e imóvel. Uma parte de seu espírito ainda fugia espavorida pelo beco.
- Que é? Estás sentindo alguma coisa?
- Não. Nada."
Pág. 122 - "Ele fechou os olhos e ficou escutando o sangue marretar-lhe as têmporas. (...) bastava falar com franqueza, explicar que aquela impotência era de origem psicológica e consequentemente passageira."
(...)
"Sentiu que a mulher wse agitava, se descobria, se soerguia. Ouviu um leve, deslizante crepitar de seda e adivinhou o que se passava. Sem abrir os olhos, estendeu a mão e, com as pontas dos dedos, viu a nudez da esposa.
Operou-se então o milagre. (...) Atirou-se sobre a mulher (...) amou-a com ímpeto bestial, cego e surdo a todos os protestos e súplicas - 'Cuidado! Assim me matas, me matas!'"
"Mas o sentimento de exaltação e vitória foi de curta duração. Chegava-lhe aos ouvidos o choro manso e sentido da mulher. Ele a havia ferido profundamente. O corpo e o espírito. Era um animal. Um cavalo!"
(...)
Pág. 123 - "Voltou para o quarto de dormir, acercou-se da cama, inclinou-se e pousou a mão de leve no ombro da esposa. Esta se encolheu bruscamente, esquivando-se ao gesto, e seu choro redobrou de intensidade."
(...)
Passou o resto da noite em claro, a fumar e a caminhar pela casa, com a sensação perfeita de que havia cometido um crime pelo qual teria de pagar quando o dia raiasse."

A Geração de 30, conhecida também como neorealista, no presente texto ultrapassa as tendências usuais da corrente, atingindo características naturalistas, como a tentativa de ser auxiliar da ciência, a tentativa de explicar (no caso, psicologicamente) o comportamento humano: o homem é o resultado do menino.

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