O que fariam dez homens reunidos no coreto da praça da
Matriz de Pouso do Sossego, numa noite chuvosa? Entre cochichos, risos abafados
e pigarros, eles aguardam a meia-noite. Liderados pelo comerciante Osório,
esses respeitáveis senhores de bem têm um dever a cumprir: manter a ordem e a
honra do lugar onde vivem.
Tendo como cenário uma pequena cidade interiorana, nomeada ironicamente Pouso do Sossego, o autor cria dois planos narrativos: o primeiro tem a duração de uma noite e é narrado em primeira pessoa por Osório, cujo olhar conduz o leitor por essa longa e trágica noite; no segundo plano, batizado de "Coro", um narrador em terceira pessoa retoma episódios do passado.
Presente e passado dialogam ao longo do romance, num jogo de
sombra e luz: as ações do presente são envolvidas pela noite, pela chuva, por
sombras e vultos, ódios e rancores; os acontecimentos do passado desfilam
coloridos, sobretudo pela chegada à cidade de ruidosa e alegre companhia
circense.
Nesse microcosmo povoado de personagens emblemáticas, Braff desnuda os subterrâneos do poder, calcado na hipocrisia e na intolerância. Diferente de seu último romance, Bolero de Ravel, também publicado pela Global, em que o ficcionista detém suas tintas na composição de um único e enigmático personagem central, em Tapete de Silêncio pode-se dizer que Pouso do Sossego (e suas mazelas) constitui a peça nuclear do romance. E a tradição, moeda de honra do lugar, deve ser mantida com a paz dos cemitérios.
TRECHO DO LIVRO
"Esta chuva surpresa nenhuma, aquelas nuvens grossas
amontoando-se a tarde toda no topo do morro escuro. Primeiro aviso se formando
além da Vila da Palha, no alto. Então pensei, vai chover. Depois o vento frio
que varreu por baixo a rua, arrepiando os braços da cidade. Da porta do armazém
eu olhava na lonjura o morro: esta noite vai chover. Agente sentia com a pele,
o sentido, mesmo sem pensamento, nosso corpo. E chovendo, assim, a cidade toda
no resguardo, a televisão na sala. Com sol ou chuva, o recado firme pra nossa
turma. De hoje não passa, o safado. Na praça, o banco debaixo da
seringueira."
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