domingo, 28 de abril de 2013

FRAGMENTO DE UMA HISTÓRIA INFANTIL

Este capítulo de uma história infantil é do livro inédito Galinda, a história de uma galinha que pela primeira vez vai ser mãe.
3. As vizinhas
 Ainda não era bem meio-dia, mas o calor já deixava todos de bico aberto, olhando para os lados com os olhos meio estúpidos de quem está sentindo calor. Dona Galinda, meio acordada, meio cochilando, ouviu alguém entrando no puxado entoando um cóóóóóó-có-có-có-có-có-có, que era sinal de que um dos ninhos seria ocupado. Ergueu a cabeça a tempo de ver Penélope pulando para a beirada de seu ninho, do outro lado do cômodo. Estabanada do jeito que era, pulou para dentro do ninho sem o menor cuidado. Dona Galinda levou um susto, pensando que ela poderia quebrar os ovos. Mas não havia ovo nenhum no ninho de Penélope, apenas uma pedra branca oval, que as pessoas chamavam de indez. Um ovo de faz-de-conta pra enganar galinhas, todas muito tontas. 

Já começava a cochilar novamente quando ouviu o mesmo có-có-có entrando no puxado. Era uma novata, a Pintada, que botaria pela primeira vez. Aos poucos foi perdendo o sossego com a conversalhada de galinhas velhas, novas, de frangas em início de carreira. Tentou impor silêncio com um grito rouco, mas ninguém deu bola pra ela. Olhou em volta e descobriu que a galeria inteira de ninhos estava ocupada por suas vizinhas.
Não demorou muito para que a Pintada, a que tinha entrado primeiro, desse um pulo para o chão, batendo as asas e gritando como uma desesperada: o maior escândalo. Ela, todo mundo sabia disso, estava anunciando que havia botado um ovo. E gritando daquele jeito ela atravessou o terreiro e sumiu para os lados do pomar. O galo prolongou um canto feliz, a cabeça jogada para trás. Ele se sentia o Rei do Terreiro, o poderoso, por isso correu em perseguição ao Coque, um frangote que nem esporas tinha, mas que já andava se engraçando com as galinhas. Atravessaram a ponte e foram também parar debaixo do arvoredo, onde o Coque conseguiu se esconder debaixo de uma carroça velha.
Depois o silêncio. Um silêncio quente, naquele cubículo pouco ventilado. No terceiro caixote depois do seu, ela ouviu um gemido, um ruído agudo forçando uma garganta. Então um pequeno baque, de ovo sobre as palhas, e a galinha, batendo as asas, jogou-se com sua gritaria pela porta, fazendo o mesmo percurso da Pintada. Quem veio todo afobado para saudar a galinha, foi o Coque. Ah, coitado, mas na metade do caminho, seu Cucurucu, imponente, se atravessou com o peito erguido. O Coque disfarçou, beliscou alguma coisa no chão, e voltou para o pomar.
Menos de uma hora depois da Pintada ter saído gritando, Dona Galinda já estava completamente sozinha. Por isso, pensou o mais rápido que pode: vou dormir um pouco. Não tinha acabado de fechar as pálpebras e ouviu a porta do cubículo rangendo. A Mulher, aquela que jogava milho no terreiro, entrou por baixo de seu chapéu de palha, com abas muito largas, e um cesto preso pela alça. Dona Galinda encolheu-se toda, as penas eriçadas, e soltou uns gritos pavorosos, gritos de assustar inimigo. Mas a Mulher nem chegou perto dela. De ninho em ninho, ela foi recolhendo os ovos recém-botados.
Terminada sua coleta, a Mulher se afastou, depois de empurrar a porta, deixando apenas uma fresta por onde só mesmo galinha poderia passar.
Dona Galinda finalmente pode dormir.  

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