Texto extraído do livro juvenil "No fundo do quintal", editado pela FTD.
Um barulho
estranho
Então eu
paro, teso pensante, parado olhando. Olho pra trás e pra frente. Nossa trilha
não progrediu grande coisa, mas agora o mato é mais ralo e menos grosso, acho
que vamos abrir mais rápido. Nas árvores, estas troncudas aí, não mexo, elas
ficam como estão. O que preciso derrubar são estas varetas de canela fina e
arrancar o mato rasteiro pra deixar uma trilha de terra. A Fernanda me diz que
estou brilhando, o rosto e o peito suados. O sol não dá folga e aqui o ar não
se mexe de tão velho que é o lugar. A Fernanda está sequinha porque não faz
força. Às vezes eu brigo com a Fernanda, principalmente quando não entende o
que eu quero e me parece que não entende porque não quer. Minha irmã. Muito
minha irmã. Não preciso de companheira melhor do que ela. Pois minha irmã vem
me ajudando bastante. Os arbustos que derrubo e a relva que arranco com a
enxada é ela quem recolhe e leva pra um monte lá perto do muro da direita,
depois daqueles cacos de telha. Assim a trilha já vai ficando limpa.
Hoje foi
nosso primeiro dia de aula e fiquei conhecendo um pouco os colegas, e quatro
professores. A Beatriz freqüenta a mesma escola, mas a gente só se encontrou no
recreio. Nós três ficamos juntos, o tempo todo. A Fernanda fica rindo de mim
porque eu não sei o que dizer, assim, de coisa séria. Mas acho que nem preciso.
Depois dos deveres foi que viemos para o fundo do quintal.
Minha irmã
me pergunta: O que é que você viu? E eu não respondo logo, ainda calculando,
escolhendo, vendo o que se pode fazer. Ou o que se deve fazer. Só então explico
à minha irmã que uma trilha em linha reta, como eu tinha pensado no início, é
um caminho que qualquer idiota pode descobrir. E nossa cabana não pode ficar
exposta a qualquer olho de infiel, por isso estou pensando num plano diferente,
com passagens secretas de uma trilha à sua continuação, mas em ziguezagues,
como num labirinto. Tenho de explicar a ela o que é labirinto, eu, que não
tenho muita paciência pra explicações. Prometo a ela que depois eu empresto o
livro da lenda do Teseu e do Minotauro. Acho que a Fernanda vai gostar.
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