Foi o Deonísio da Silva, o
irreverente, quem o apodou. Gostamos, e
até hoje não consigo me lembrar do Antonio Skármeta sem que o Núncio Apostólico
criado pelo Deonísio me venha junto. Aquele sorriso meio maroto por baixo do
bigode num rosto de bem nutrido, com a calva exposta e sem rebuço, realmente
caiu-lhe bem a alcunha.
Muitos de vocês devem estar
lembrados do Núncio Apostólico em Ribeirão Preto, como convidado de uma das
Feiras do Livro passadas. Comemos, bebemos, conversamos com o autor do
conhecidíssimo O carteiro e o poeta,
popularizado por filme homônimo. Pouca gente sabe, entretanto, que Antonio
Skármeta é um dos nomes de maior relevo da literatura chilena. Além de O carteiro e o poeta, são de sua autoria
romances como Não foi nada, A velocidade
do amor, As bodas do poeta, A garota do trombone, O baile da vitória e
outros, muitos outros.
Foi de Antonio Skármeta o romance de
1982 que acabei de ler, e sou obrigado a me confessar encantado cada vez mais
com sua literatura. A insurreição tem
como fundo histórico nada mais nada menos que a Revolução Sandinista, assunto
que, em literatura está a um passo do precipício panfletário. Não foi o que
aconteceu.
A ação está centralizada na cidade
de León, na costa oeste da Nicarágua e perto do lago de Manágua. A época tem
como acontecimentos principais a luta armada dos sandinistas até a derrubada de
Somoza.
As personagens do romance são
principalmente pessoas do povo que de forma indireta, com membros da família,
pequenos atos e muitas vezes apenas com sua opinião, participam da revolução.
Mas há também o quartel, centro da repressão, personificada no capitão Flores e
a truculência de seu sargento. Das montanhas chegam os poemas que Leonel,
ex-estudante de direito envia (e nem sempre chegam) para Vicky, por quem é
apaixonado. As famílias, suas relações em tempo de guerra, os apertos,
tristezas e alegrias, vão desfilando na medida em que o romance progride.
O que talvez haja de mais notável
neste romance é o tratamento que Skármeta dá à linguagem. Em momento algum faz
discurso pró ou contra ninguém. Ele apenas relata os fatos, e seus comentários
são sempre carregados de um fino humor e muita ironia. Mais ainda: há momentos
de intenso lirismo, a despeito do tema principal: a guerrilha que depôs Somoza,
o ditador.
Bella Jozef, professora da UFRJ
falecida em 2010 e uma das maiores especialistas em literatura
latino-americana, na orelha do livro assim se manifesta:
Não
constrói um mundo mítico para aludir à realidade. Parte do cotidiano e,
perseverante em sua verdade, resolve as discussões sobre a relação
literatura/sociedade, compartilhando com o leitor a experiência do mundo. Parte
do real e volta a ele com novas significações. A cada instante, o tom justo
para fazer-nos participar das angústias, esperanças de homens e mulheres −
seres comuns de carne e osso − em convivência plena com a realidade.
Alta literatura. Um romance sobre
paixões que apaixona.
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