O que todas têm em comum é o fato de sua publicação original ter ocorrido pelo menos dois anos antes da postagem nesta coluna e de provavelmente ainda não terem sido lidas pela maioria de nossos seguidores atuais.
A entrevista de hoje foi concedida a Rui de Lucca Trizóglio, da Tribuna da Região, de Serrana, em 29 de janeiro de 2007.
Entrevista com o escritor de Serrana, Menalton Braff
Resolvi desta vez, oferecer neste espaço algo diferente para
você, internauta, entrevistando um escritor que admiro bastante. Trata-se de
Menalton Braff. Ele vive atualmente na cidade de Serrana, bem perto de Ribeirão
Preto, publicou romances e livros de contos, ganhando, inclusive, no ano de
2000, o Prêmio Jabuti na categoria "Livro de Ficção do Ano" com seu
livro de contos “À sombra do cipestre”. Aqui você encontra as preferências e
opiniões acerca de temas artísticos e literários. Acompanhem a seguir a entrevista.
Rui de Lucca Trizóglio - O senhor ganhou o prêmio Jabuti em
2000 na categoria "Livro de ficção do ano". Qual a sensação de ganhar
o maior prêmio nacional de literatura? Sinceramente, antes eu
acreditava
naquele mitológico eixo Rio - São Paulo, que, para ser agraciado com um prêmio
dessa solidez, devia pertencer a uma dessas cidades. O senhor acha que esse
eixo excludente realmente existe?
Menalton Braff - Bem,
sobre a sensação posso dizer que foi o melhor susto que levei na vida. Naquele
momento eu senti que realmente existia na literatura, coisa que antes não
passava de uma aspiração, uma tentativa ou desejo. O eixo Rio - São Paulo existe em alguns
aspectos, como a proximidade da mídia nacional com as editoras, distribuidores,
agências. Mas isso não significa exclusividade ou excludência. O Manoel de
Barros continua no Pantanal, o Ariano Suassuna, em Recife, o Moacyr Scliarem
Porto Alegre, o Carlos Herculano em Belo Horizonte, enfim, há talvez mais
escritores produzindo fora do eixo do que nele. Tenho visto muita gente
lastimar a existência do eixo como desculpa para não produzir.
Rui de Lucca Trizóglio - Qual sua opinião sobre o papel da
literatura na sociedade?
Menalton Braff - Antonio Candido levou uns dez anos
produzindo o livro Literatura e Sociedade, porque o tema é extremamente
complexo. Para resumir, simplificar ao máximo, diria que é o mesmo papel das
artes em geral, ou seja, não permitir que o ser humano se brutalize totalmente.
Rui de Lucca Trizóglio - Seguindo a linha de que escrever é
uma conseqüência, quais foram os autores e livros que lhe influenciaram para a
carreira de escritor?
Menalton Braff - De
um modo geral, acordei um dia dizendo que queria ser escritor, depois que, na
juventude descobri a Geração de 30. Na verdade todos os escritores lidos
exercem influência por negação ou confirmação. Para citar alguns dos que gosto
(só a crítica pode dizer se influenciaram ou não) Machado de Assis, Graciliano
Ramos, Clarice Lispector, William Faulkner, Dostoievski.
Rui de Lucca Trizóglio - O senhor acompanha a produção
literária brasileira atual. Como vê a nova geração de escritores?
Menalton Braff - Na medida do possível. Não se consegue ler
tudo, mas procuro estar informado, mesmo que superficialmente, do que se tem
feito. Não existe geração de escritores. Existem escritores. A idéia de grupo,
escola, aqueles negócios de homogeneização de atitudes estéticas, nada disso
existe mais. Existem escritores e para falar dos escritores da atualidade
precisaríamos de muito mais tempo e espaço.
Rui de Lucca Trizóglio - Qual o perfil de um bom escritor
para o senhor? Existe algum escritor regional que o senhor se orgulha
especialmente?
Menalton Braff - Não
existe um perfil de bom escritor para mim. Existem bons escritores. Conceituar
o que é um bom escritor seria delimitar a literatura, confiná-la em umas poucas
idéias. Mas o que você entende por escritor regional? Para mim esse é outro
conceito que não se pode mais usar.
Rui de Lucca Trizóglio - Além da literatura, o senhor
aprecia outro tipo de arte? Quais os compositores, diretores, escultores... de
sua preferência?
Menalton Braff - Bom, aprecio a arte em geral. Na música
fico com Beethoven, Mendelsohn, Debussy, Bach, Mozart (caramba, a lista é muito
grande). Nas artes plásticas, os que mais me deleitam são os impressionistas:
Renoir, Degas, Monet, Manet, Rodin. No teatro há muitos diretores bons e
dramaturgos idem: Zé Celso, Shakespeare, Ibsen; no cinema, vamos lá: na Itália
– Pasolini, Visconti; na França – Alain Resnais, Roger Vadin, Chabrol; na
Espanha – Buñuel, Almodóvar, Carlos Saura.
Rui de Lucca Trizóglio - É recorrente que cada escritor tem
uma mania particular. Li em algum lugar que Gabriel Garcia Márques não escreve
enquanto não tiver ao lado 12 lápis dispostos e pericialmente apontados. O
Oscar Wilde só escrevia em folhas coloridas, o Moacyr Scliar gosta de escrever
em seu inseparável notebook, outros preparam lugares de maneira específica ou
escrevem no bar mesmo, em meio ao zumbido do povo. E o senhor, possui algum
ritual quando vai escrever o trecho de um romance ou conto?
Menalton Braff - Não
Rui, não tenho ritual. Em minha casa existe uma saleta do computador, com uma
bela bancada para eu poder me espalhar. Pois bem, todos os dias passo algumas
horas trabalhando nesse ambiente. Sento e trabalho. Às vezes já trago da rua
algumas anotações, outras vezes perco algum tempo sentado na frente do
computador. Fecho os olhos e me concentro. Nada mais que isso.
Rui de Lucca Trizóglio - O que o senhor considera ideal para
que alguém escreva bem?
Menalton Braff - Não existem ideais. Os escritores reais são
tão diferentes uns dos outros que não me parece justo querer botá-los dentro de
uma fórmula. De repente vem lá um gênio que não cabe na fórmula e nós temos de
nos descartar dele.
Rui de Lucca Trizóglio - Alguns escritores consideram a
escrita como uma prática árdua, outros acham que é um processo natural (gerado
da vontade), ainda há alguns que escrevem porque pretendem dizer algo mais. E o
senhor, como considera o processo de elaboração da escrita literária?
Menalton Braff - A escrita me dá prazer. Se não der, vai
para o cesto do lixo. Escrevo como um músico compõe ou um pintor pinta. Tenho
uma idéia, tenho os elementos concretos (figuras) desta idéia é transformar
isso em palavras, ou escolher palavras que signifiquem isso, é um prazer de que
não abro mão.
Rui de Lucca Trizóglio - O jornalista Paulo Francis disse
certa vez que houve uma fase da vida dele em que lia até oito horas por dia. As
leituras do senhor são rigorosas? Que tipos de livros prefere ler?
Menalton Braff - Leio
todos os dias, não tanto quanto o Francis, que era um tremendo mentiroso. Mas
leio principalmente literatura. De brasileiros e de estrangeiros. Lançamentos,
livros antigos que me pareçam relevantes, e assim vou levando minhas leituras.
Alguns ensaios, de vez em quando (filosofia, sociologia, antropologia, teoria
da literatura, arte em geral).
Rui de Lucca Trizóglio – Para finalizar, como se sabe, a
crítica literária muitas vezes costuma esterilizar diversos escritores, tanto
experientes quanto iniciantes, ao escrever (e isso acontece na maioria das
vezes) resenhas severas. Tanto que o termo "crítica" acaba, às vezes,
sendo interpretado com o significado de "maldizer alguma coisa". Para
o senhor, qual o papel que a crítica deve desempenhar? O que o senhor considera
uma boa crítica?
Menalton Braff - Me
parece, em primeiro lugar, que hoje, no Brasil, existem resenhistas, mas
críticos, como foram Tristão de Ataíde, Wilson Martins e outros, neste sentido
já vão escasseando. Nas universidades ainda existem alguns, mas vivem muito
isolados, pouco participando do processo literário como sistema total. Acho que
o bom crítico é aquele que analisa, aponta defeitos e virtudes, sem virulência
nem agressividade. A crítica já teve um papel importante na formação do gosto
literário do público. Deveria continuar a exercer tal papel para que se parasse
de ler os Paulo Coelho da vida. Ou pelo menos, que se pedisse algo mais
consistente depois de lê-lo.
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