segunda-feira, 2 de julho de 2018

CARTAS DO INTERIOR

Questão de ponto de vista

Não sei se já disse aqui que prefiro viajar sobre quatro rodas. Conheço muita gente que tem pressa de chegar ao destino, às vezes por necessidade, outras vezes por puro gosto de guardar seu tempo para outras coisas. Também não desprezo o destino, aquilo que me faz mover de um lugar a outro. Eis, entretanto, o tempero de uma viagem: transformar em conhecimento tudo aquilo que se encontra pelo caminho.

Ocorre também ser obrigado a chegar em prazo certo, somente possível viajando lá pelas nuvens. Então, o bom mesmo é viajar na janelinha, com a ilusão de ver o que está na terra, mas vendo tão-somente algumas nuvens que enfeitam o céu. O que está na terra, para quem observa das nuvens, são formiguinhas, imóveis, e quase sempre nem isso é possível ver lá da janelinha.

Dias atrás, minha mulher e eu preparamos uma viagem para o Sul, sem horários a nos perturbarem, sem compromisso para chegar em lugar algum. A viagem era o que importava, o que íamos encontrando pelo caminho.


E foi assim que descobrimos estar o norte do Paraná coberto de trigais e milharais. Pensávamos que era ainda o café a principal cultura da região. Os trigais, aquele verde delicioso, estavam ainda com pouco mais ou menos cinco centímetros de altura. Colinas inteiras cobertas por campos verdejantes, de uma cor viva, como algo que vai nascendo.

Mas em contraponto aos trigais que íamos encontrando, apareciam também os milharais. E para nossa surpresa, um tipo de pé de milho que desconhecíamos. Eles eram anões. Mais tarde, consultando um leigo em agricultura, mas não tão leigo como nós, ficamos sabendo que é um tipo de milho usado para forragem. Picado por máquinas o pé de milho vai para os silos, de onde sai para alimentar animais.

Outra descoberta no norte do Paraná foi o estado em que estão muitas obras federais por este Brasil afora. Rodamos várias horas por uma pista com duas mãos, em estado precário de conservação, e ao lado de uma faixa de cimento já pronta, mas entregue ao mato. Isso aconteceu por dezenas, talvez centenas de quilômetros. Uma faixa de cimento com vinte ou mais centímetros de espessura sem a menor utilização. É a BR-163. Quem sabe um dia se torne uma estrada. Pontes inacabadas sem qualquer sinal de que estejam em construção. Eis o Brasil do desperdício.

Vimos mais, o rio Uruguai, majestoso, passamos pelo Iguaçu, os dois cortando montanhas e florestas, correndo por várzeas, silenciosos, cumprindo seu papel de levar a vida que suas águas proporcionam.
Por fim, chegamos a São Miguel das Missões, mas isso já é história para outro dia.

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