segunda-feira, 16 de julho de 2018

CARTAS DO INTERIOR

O DESTINO É O PERCURSO   


Nem tanto, pois queríamos conhecer as ruínas jesuíticas em São Miguel, mas não desprezávamos tudo que veríamos à beira da estrada até lá. Pousamos em Palmeira das Missões, cidade que me deixou frustrado. Durante dois anos minha família tinha morado nessa cidade, e ingenuamente eu contava encontrar algum resíduo que fosse da cidade em que passei belos dias da adolescência. Não reconheci mais nada, praças, prédios, monumentos, nada mesmo. Mas era noite e resolvemos passá-la no único hotel da cidade.

Nós, que já havíamos rodado cerca de 1.500 quilômetros, de manhã bem cedo resolvemos enfrentar os quase duzentos quilômetros que restavam de estrada até os restos da redução indígena, nosso primeiro destino, já que a cidade de Palmeira não me devolvera um pedaço da adolescência.

Regiões de serra que se alternavam com suaves colinas, que ainda não eram os pampas, anunciados por aquela região. O dia nascera esplendoroso: céu muito azul, ventos brandos, temperatura, bem... deixamos o aquecedor do carro ligado, árvores, campos e mais campos de trigo nascente, campos verdes, muito verdes.

Finalmente, saindo da estrada real, com cerca de uns quinze quilômetros de uma estradinha, dessas de pouco movimento, chegamos ao estacionamento da redução. Ao longe já se avistava o templo de pedra construído por índios guaranis sob a orientação de padres jesuítas. O pátio à frente da igreja colossal é de cento e trinta metros de grama bem cuidada, onde outrora ficavam as casas dos mais de 4.000 indígenas (alguns falam 7.000), a população reunida ali pelos jesuítas espanhóis. Isso
acontecera em 1.632 em outra região, forçados a mudarem duas vezes perseguidos por aventureiros em geral e por bandeirantes à cata de escravos indígenas. Só em 1.687 a redução se estabeleceu
onde hoje encontramos suas ruínas.

As paredes de pedra, colunas com capitéis de pedra lavrada, os arcos internos das passagens de um ambiente para outro, a imensa extensão do prédio ainda conservado em sua aparente incompletude. No entorno do prédio, restos de muros, vestígios de fundações de outras construções, e muitos outros sinais de que naquele local, há mais de trezentos anos, houve uma tentativa de uma povoação de tipo diferente.

Alguns historiadores afirmam que os Sete Povos das Missões tinham sido parte de um projeto de jesuítas espanhóis que pretendiam construir ali uma nação teocrática, tendo sido os índios, os escolhidos, por serem ingênuos e puros, sem a corrupção da civilização.

Andar por aqueles espaços, observar o trabalho dos guaranis, imaginar que tudo aquilo resultou em nada por cobiça de alguns, tudo isso emociona.

Em 1750 foi assinado o Tratado de Madri, sendo a região cedida ao domínio português, em troca do Uruguai que passou à posse da Espanha. Em 1759 os jesuítas foram expulsos dos reinos de Portugal e Espanha e os projetos de um paraíso na Terra começaram a murchar.

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