Esta coluna reúne crônicas inéditas de Menalton Braff.
ÚLTIMA LOCADORA
Houve um tempo em que às sextas-feiras a gente procurava em uma das muitas Locadoras existentes na cidade algum filme que valesse a pena. E valer a pena, que parece um conceito vago, impreciso, na verdade não é. Valer a pena é o que a gente espera dos dois planos em que se sustenta qualquer obra de arte. O plano da expressão e o plano do conteúdo. Se passo por dentro de um filme e saio do lado de lá do mesmo tamanho, ele não vale a pena. Sua obrigação como obra de arte é me fazer pensar, refletir sobre mim mesmo e/ou sobre o mundo. Ele deve me provocar alguma emoção.
Mas não pode ser apenas isso. Ele deve apresentar algum questionamento a respeito de si mesmo no plano da expressão. Se a expressão for inovadora e estiver adequada ao conteúdo, então ele vale a pena.
Em uma cidade de seiscentos mil habitantes, como dizem os vereadores, a última locadora de filmes está encerrando suas atividades. A última. Haverá uma grande queima de filmes e pretendo estar lá para salvar alguns. Segundo os proprietários da locadora (agora pensando em outra atividade para sobreviver), as pessoas, ou sua maioria, baixam filmes em casa, sem custo nenhum. Nada de errado
quanto a isso, que desde muito tempo era uma coisa previsível. Assim caminha a humanidade mergulhada em tecnologia. Não há como voltar. O mal do fenômeno nem é dele mesmo, fenômeno.
O mal está no público para quem os sítios oferecem suas obras. De acordo com Pesquisadores, as pessoas procuram apenas filmes de entretenimento. Em resumo, a maioria das pessoas prefere algo que não lhes ultrapasse a pele, que não provoque alguma transformação. O filme serve para “matar o tempo”. Este negócio de crescer, de ampliar sua visão de si mesmo e do mundo, isso é muito cansativo. Arte é uma coisa que incomoda.
Bergman, Pasolini, Buñuel, Herzog e outros do mesmo quilate são diretores que jamais vão entrar na lista de preferências da maioria das pessoas. As pessoas que só querem matar o tempo sem sofrer qualquer arranhão em sua consciência, em sua emotividade. Simplesmente matar o tempo. Ver um filme ou participar de uma pelada em praia ou campo, tudo a mesma coisa. O tempo é fluido, o tempo passa.
Pois bem, tenho a notícia de que a locadora, a última da cidade, já se desfez de praticamente todo o acervo dedicado ao puro entretenimento. Os clássicos continuam lá, esperando quem espera um pouco mais de um filme, ou seja, quem esteja procurando arte.
Vamos lá?
Blog de Literatura do escritor Menalton Braff, autor de 26 livros e vencedor do Prêmio Jabuti 2000.
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segunda-feira, 20 de agosto de 2018
CARTAS DO INTERIOR
Postado por
Anônimo
às
12:28
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