sábado, 15 de junho de 2019

ENTREVISTAS QUE VOCÊ NÃO LEU


Esta coluna reprisa entrevistas de Menalton Braff. A postagem de hoje foi concedida a José Nunes, do site COMO EU ESCREVO.

Como escreve Menalton Braff
23 de agosto de 2018 by José Nunes
Menalton Braff é escritor com 24 livros publicados e um no prelo.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Por uma questão de saúde, começo meu dia com atividade física durante 80 minutos. Não me agrada isso, mas o médico me exigiu. Lá pelas nove horas vou para o computador e respondo e-mails, dou uma passada pelo face, apenas uma passada, porque a Sylvia (uma jornalista de São Paulo) é quem administra minha rede. Feito isso, me disponho a escrever. Literatura, é claro.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
O pior horário é pós-almoço. Vejo um noticiário na televisão e por volta das duas horas, pouco menos, começo minha rotina de leitura. À tarde também posso dedicar meu tempo às questões do dia-a-dia (banco, compra, médico, dentista etc.).
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Escrevo um pouco por dia. Coisa de duas, três horas no máximo. Sou muito lento na escrita. Escrevo, volto ao que fiz, troco palavras, refaço o que está feito, tudo sem nenhuma pressa. Só quando tudo encaixa bem no meu ouvido é que passo adiante. Valorizo muito o trabalho com a linguagem. A écriture artiste.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Bem, só inicio um texto depois de saber como deve começar e terminar. Então, quando mentalmente já tenho o sentido (não as palavras) do início e do fim, torna-se mais fácil começar. O meio, que podemos chamar de recheio, isso vai sendo criado na própria medida em que se avança, mas sempre tendo como objetivo chegar a um fim previamente
determinado. Repito, as palavras com que vou expressar o início e o fim só aparecem na hora em que sento à frente do computador. Raramente surge uma frase inteira com que começar a escrever. Pode aparecer, mas não é muito frequente.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Primeiro, escrevo todos os dias, portanto não existe projeto longo. Um projeto não é diferente do que faço diariamente. As travas exigem às vezes alguns dias de descanso. Não muitos. Às vezes acontece de precisar fazer uma viagem no meio de um capítulo, ou no meio de um conto. Isso sim, geralmente é muito ruim. Uma viagem de uma semana atrasa a escrita mais umas duas ou três semanas, pois é necessário reler tudo que está escrito e esperar ser dominado pelo ambiente da narrativa. Muitas vezes isso pode demorar. Mas volta. É ter paciência e entra-se novamente no clima. Ansiedade não sinto, sei o que precisa ser feito e faço sem pressa. Não tenho compromisso com editora nenhuma, e penso que não terminar um texto é assunto que só a mim cabe julgar. Trabalho muito livre.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Durante a escrita, parágrafo a parágrafo, já vou revisando, substituindo palavras, omitindo outras, acrescentando algumas, refazendo o parágrafo inteiro quando parece o mais acertado. No final, posto o ponto final, então uma última leitura daquilo que já foi exaustivamente trabalhado. Só então passo para minha esposa que é quem faz a primeira crítica. E ela é doutora em Estudos Literários pela UNESP de Araraquara, ou seja, não é nada ingênua no assunto. Quantas vezes eu reviso é coisa que não sei responder. Depende de como saiu o texto inicial. Posso não revisar nenhuma vez. Isso também acontece.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Comecei, quando adolescente, escrevendo em cadernos. Romances, contos, tudo coisa que abandonei como ensaios de um aluno de narrativas. Depois comecei a escrever numa Olivetti. Já era o céu. Cheguei a me tornar um bom datilógrafo. Mas acontece que o computador, com todos os recursos que botou à nossa disposição, ah, não tem como fugir dele. A primeira palavra já é escrita (digitada?) no computador. Esta passagem foi mais ou menos dolorosa. Quando aderi, não pensei nos condicionamentos que tive de enfrentar. Durante uns seis meses não consegui produzir um parágrafo que prestasse. Até que um escritor amigo me mandou um programinha que fazia todos os movimentos e ruídos da máquina de escrever. Foi minha salvação. Com o tempo, abandonei o programinha e nunca mais me lembrei da Olivetti.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
As minhas ideias, costumo dizer que veem do que me encanta ou do que me espanta. A vida, a minha e do ambiente em que vivo; as histórias ouvidas e/ou vividas; a leitura de outros livros; um grito, uma paisagem, uma ruína, um pássaro que passa no céu, uma ideia. Uma narrativa pode surgir como sugestão de figuras, então vai procurar seu tema; ou surgir como sugestão de um tema, então vai procurar as figuras com que desenvolver-se.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Acho que pouca coisa mudou, mas no que tange a técnicas narrativas, sinto que houve crescimento, na medida em que fui descobrindo modos diferentes de narrar e posso chamar isso de amadurecimento. Aliás, um processo que não tem fim. Cada texto é uma nova experiência, um novo recurso empregado para dizer alguma coisa. Claro que diria a mim mesmo exatamente isso, que um texto é sempre uma experiência nova, coisa que não tem fim.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
O romance que há anos penso escrever, mas sei que não vai surgir a oportunidade de fazê-lo é um romance histórico com base na vida da Bárbara Heliodora. Sua história me apaixona, mas teria de morar pelo menos meio ano em Ouro Preto, para me situar, para poder imaginar a paisagem física e humana da região no século XVIII. Fica na conta de sonhos não realizados. Gostaria de ler um livro que comovesse a humanidade toda a ponto de abjurar toda violência, mas principalmente as guerras e os preconceitos. Um texto carregado de poesia.
Filed Under: Entrevistas


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