segunda-feira, 26 de agosto de 2019

CARTAS DO INTERIOR

Esta coluna reúne crôncas de Menalton Braff.

Nossas origens


Tenho a impressão de que já apresentei a vocês meu amigo Adamastor. Mas penso que seria uma apresentação ociosa, pois nascido antes de 1580 (quando seu pai morreu), ele já virou o mundo do avesso até chegar à nossa amada e triste terra. Hoje é meu vizinho e gosta muito de me contar coisas de nosso passado.

O Adamastor morava ali no sul da África, mais exatamente no Cabo das Tormentas, e viu quando bravos portugueses se lançavam ao mundo pelos caminhos salgados. Imediatamente encheu-se de orgulho, pois se julgava de origem portuguesa, um povo de altos cometimentos.

As naus portuguesas chegaram à Índia e lá plantaram Goa, cidade de muito futuro; de lá deram um pulinho até a China onde deixaram sua marca na cidade de Macau. E na África, talvez porque mais perto, iniciaram a conquista de vários territórios, como Angola, Moçambique, Guiné Bissau que mais tarde, já no século XX, tiveram de abandonar, elevando-se tais territórios a países independentes.

Ah, sim, mas já ia esquecendo que vieram também à América do Sul e aqui chegando viram que era terra para não mais acabar e que, além disso, nas costas daquela enormidade de território havia uma árvore de que se podia fazer uma tinta vermelha como brasa, então inventaram o Brasil.

E caíram fora.

Quando viram o que o povo ali plantado fazia naquelas paragens, caíram fora. Houve alguém no passado tentando devolver o país para Portugal, mas eles, os portugueses, não aceitaram.

Os naturais deste novel país gostam muito de contar historietas provocando o riso às custas dos seus inventores. Hoje o mundo todo se delicia com o riso consequente das coisas que aqui acontecem.

Mais tarde, e já nos aproximamos dos dias atuais, meu amigo Adamastor, aquele gigante nascido no Cabo das Tormentas, no extremo sul da África (pelo menos é o que nos informa aquele vate, o Luís de Camões) apareceu aqui em casa para uma taça de vinho, e veio me contar muito preocupado que surgia neste país um movimento entre políticos locais, oferecendo o país, praticamente de graça aos Estados Unidos, por causa da amizade demonstrada por um senhor cuja cor ele copia das laranjas.

Até agora parece que ele não se moveu no sentido de aceitar a oferta, e além disso, deu a entender que pode até aceitar, mas em lugar de pagar pelo país ele é que vai cobrar. E não é por pouca coisa que aceita tomar posse, pois existem tantas coisas que deverá arrumar por aqui que a oferta que lhe fizeram não é muito tentadora. E realmente, eu fiz o Adamastor ver, só para manter as florestas sem queimadas, vai precisar de muitos soldados.

O Adamastor saiu daqui de casa depois de duas garrafas de vinho (não esqueçam que se trata de um gigante) realmente acabrunhado. Até penso que anda com vontade de ir viver na Europa, França ou Portugal.

Depois disso fui dormir, enquanto não nos mandam desocupar a terra.

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