domingo, 26 de fevereiro de 2012

NOITE (24)

O PRESENTE É FRUTO DO PASSADO

Pág. 123 - "O suor escorre-lhe pelas faces. Tem a impressão de que todas essas coisas odiosas aconteceram não há meses, mas na noite que passou."
(...)
"Os desastres daquela primeira noite foram a causa de todos os desencontros e frustrações dos dias e noites que se seguiram."

"Pensou mais de uma vez em procurar um analista e contar-lhe tudo, porém um pudor invencível o deteve. (...) Era até com certa relutância que contava essas coisas a si mesmo.
Nem tudo, porém, andava sempre mal naquela casa. Havia períodos de relativa normalidade que se prolongavam durante dias e até semanas.
Seu trabalho de pesquisa, pelo qual se interessava com uma es´pécie de fria paixão, ajudava-o muitas vezes a esquecer as dificuldades domésticas."
Pág. 124 - "Quando, porém, sugbiam para o quarto, voltava-lhe a dor de cabeça, a inibição, a anestesia parcial do corpo. Ela, entretanto, não se conformava cvom a situação: tomava a iniciativa, procurava chamá-lo à vida. Ele se escandalizava ante esses arroubos lúbricos - que achava indecorosos - mas nem por isso permanecia insensível a eles. (...) Terminado tudo, lá estava ela a seu lado, sorridente e compreensiva (como era insultuosa aquela condescendência, como o  rebaixava aquele perdão!) a passar-lhe a mão pelos cabelos..."
"Numa certa madrugada em que o fracasso foi completo, precipitou-se para a rua, exasperado, aceitou o convite da primeira vagabunda que encontrou, e meteu-se com ela na cama, só para provar a si mesmo que era normal. (...) ... nojo de si mesmo e com a impressão de que estava irremediavelmente sujo."
Pág. 125 - "Nas primeiras horas do despertar não se lembrou do que havia acontecido na véspera. Foi como se entre a manhã e a noite que passara se houvesse erguido uma sólida muralha cinzenta. "
(...)
"Ergue os olhos. Ali está a pracinha com seu quiosque, os bancos verdes, o chafariz colonial, as árvores anãs. Quantas vezes ele e a mulher vieram à tardinha sentar-se naqueles bancos!
Nunca mais. Ela não voltou. Nem voltará. Está tudo perdido. Só lhe resta meter uma bala na cabeça."
(...)
"Senta-se pesadamente num dos bancos da praça e esconde o rosto nas mãos.
Estavam na casa de amigos, numa festa de aniversário.  (...) Uma pequena orquestra tocava na área ladrilhada.
Ele observava a mulher com um misto de admiração e inveja, enquanto ela, com um copo na mão, andava dum lado para outro, de grupo em grupo, soltando risadas... (...) ... não podia deixar de sentir um mal-estar quando a via cercada de homens. (...) Não poderia ela ser me4nos expansiva? (...) E que mania irritante, aquela de tocar sempre o interlocutor! Lá estava ela a dar palmadinhas na mão dum homem...
Alguém sugeriu que dançassem. Os primeiros pares dirigiram-se para a área. Nesse momento ele decidiu levar a mulher para casa..."
"- Mas, querido, agora é que a festa está começando a ficar gostosa!"
(...)
"- Vamos ficar só um pouquinho mais - suplicou ela.
Tinha o rosto afogueado, os olhos brilhantes ('Uma cadelinha no cio' - cochicharam as três tias de preto que a vigiavam dum remoto canto do passado)."
(...)
"Ela não devia permitir que o par a apertasse tanto. Era acintoso. E que era que ele dizia de tão engraçado que a fazia soltar aquelas risadas, atirando a cabaça para trás?"
(...)
"Três homens a cercaram. A orquestra rompeu numa rumba. (...) Um segurou-lhe o braço, outro enlaçou-lhe a cintura, o terceiro pôs-se a dançar na frente dela, rebolando despudoradamente as ancas."
(...)
"Foi esconder seu ressentimento e sua vergonha no fundo do jardim, num recanto sombrio, de onde ficou a ouvir a música, as vozes e as risadas - sim, os latidos da cachorrada."
(...)
"O estribilho não lhe saía da cabaça. Está bêbeda."
"Ao chegarem à casa, ela entrou e ele foi guardar o automóvel. Quando subiu para o quarto, minutos depois, teve um choque. Encontrou-a completamente despida, a elsperá-lo de braços abertos, os seios palpitantes, os olhos úmidos de desejo. (...) ... a mulher trazia no corpo o cheiro de todos os homens que a haviam tocado)... Sentiu uma necessidade invencível de insultá-la, feri-la, fazê-la pagar por todas as humilhações que ele sofrera aquela noite.
Os dedos da mulher se lhe atufavam, aflitos, nos cabelos. Ela o atacava com uma agressividade de homem, como se quisesse penetrá-lo, violentá-lo.
'Excitou-se com os outros...' - pensava ele. De repente agarrou-a pelos ombros brutalmente e num repelão atirou-a sobre a cama, gritando: 'Cadela indecente!' "

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