Em nossa última postagem, Macunaíma encontra uma cotia, a quem chama de ávó. Ela joga uma lavagem sobre o corpo do menino que imediatamente se transforma num homem. Mas a cabeça, que não recebeu o líquido mágico, continua pequena. Corpo de homem, cabeça de criança.
Mais tarde, ele se engana e mata a própria mãe. Os três irmãos a enterram e choram muito sobre a sepultura.
Pág. 27 - "Uma feita os quatro iam seguindo por um caminho no mato e estavam penando muito de sede, longe dos igapós e das lagoas. (...) De repente Macunaíma parou riscando a noite do silêncio com um gesto imenso de alerta. Os outros estacaram. Não se escutava nada porém Macunaíma sussurrou:
- Tem coisa.
Deixaram a linda Iriqui se enfeitando sentada nas raízes duma samaúma e avançaram cautelosos. Já Vei estava farta de tanto guascar o lombo dos três manos quando légua e meia adiante Macunaíma escoteiro topou com uma cunhã dormindo. Era Ci, Mãe do Mato. Logo viu pelo peito destro seco dela, que a moça fazia parte dessa tribo de mulheres sozinhas parando lá nas praias da lagoa Espelho da Lua, coada pela Nhamundá. A cunhã era linda com o corpo chupado pelos vícios, colorido com jenipapo.
O herói se atirou por cima dela pra brincar. Ci não queria. Fez lança de flecha tridente enquanto Macunaíma puxava de pageú. Foi um pega tremendo e por debaixo da copada reboavam os berros dos briguentos... (...) ´(pág. 28) O herói apanhava. (...) Afinal se vendo nas amarelas porque não podia mesmo com a icamiaba, o herói deitou fugindo chamando pelos manos:
- Me acudam que sinão eu mato! me acudam que sinão eu mato!"
Os irmãos imobilizam a mãe do mato e batem até que ela não tenha mais movimento. Macunaíma então brinca com ela quanto quer.
"Vieram então muitas jandaias, muitas araras vermelhas tuins coricas periquitos, muitos papagaios saudar Macunaíma, o novo imperador do Mato-Virgem.
E os três manos seguiram com a companheira nova. Atravessaram a cidade das Flores evitaram o rio das Amarguras passando por debaixo do salto da Felicidade, tomaram a estrada dos Prazeres e chegaram no capão de Meu Bem que fica nos cerros da Venezuela. Foi de lá que Macunaíma imperou sobre os matos misteriosos, enquanto Ci comandava nos assaltos as mulheres empunhando txaras de três pontas."
O herói passa a ter uma vida folgada. O dia inteiro na rede ou caminhando em volta da morada. Afinal, era o imperador.
"De noite Ci chegava rescendendo resina de pau, sangrando das brigas e trepava na rede que ela mesmo (pág. 29) tecera com fios de cabelo. Os dois brincavam e depois ficavam rindo um pro outro. "
(...)
"(...) Morto de soneira, infernizado, Macunaíma brincava para não desmentir a fama só, porém quando Ci queria rir com ele de satisfação:
- Ai! que preguiça!...
que o herói suspirava enfarado."
Dava as costas para Ci, mas ela não desistia.
"- Faz isso não, oferecida!
- Faço!
- Deixa a gente dormir, meu bem...
- Vamos brincar.
- Ai que preguiça!...
E brincavam mais outra vez. "
Expressões populares:
"Uma feita" - expressão típica das histórias infantis.
"guascar o lombo" - expressão gaúchesca; guasca é o mesmo que chicote.
"légua e meia adiante" - légua e meia é maneira popular de se referir a uma distância indefinida.
"cunhã" - moça, em tupi-guarani
"peito destro seco" - contam as lendas que as índias amazonas extirpavam o seio direito para melhor guerrearem de arco e flecha. O seio extirpado não atrapalhava os movimento.
"pageú" - qualquer instrumento de cutelaria produzido na região do rio Pajeú.
"um pega" - expressão popular urbana
"se vendo nas amarelas" - expressão popular paulistana da época
"Me acudam sinão eu mato" - expressão popular urbana para alguém que "foge para não matar". Obs.: sinão - Mário de Andrade propunha várias alterações na ortografia para aproximar a excrita da fala, ou seja, uma escrita fonética em lugar da existente, que é histórica.
Observação: O parágrafo que se inicia com "Vieram então..." é um bom exemplo da ruptura com a lógica espaço-temporal, inexistente no pensamento mágico.
(CONTINUA)
Mais tarde, ele se engana e mata a própria mãe. Os três irmãos a enterram e choram muito sobre a sepultura.
Pág. 27 - "Uma feita os quatro iam seguindo por um caminho no mato e estavam penando muito de sede, longe dos igapós e das lagoas. (...) De repente Macunaíma parou riscando a noite do silêncio com um gesto imenso de alerta. Os outros estacaram. Não se escutava nada porém Macunaíma sussurrou:
- Tem coisa.
Deixaram a linda Iriqui se enfeitando sentada nas raízes duma samaúma e avançaram cautelosos. Já Vei estava farta de tanto guascar o lombo dos três manos quando légua e meia adiante Macunaíma escoteiro topou com uma cunhã dormindo. Era Ci, Mãe do Mato. Logo viu pelo peito destro seco dela, que a moça fazia parte dessa tribo de mulheres sozinhas parando lá nas praias da lagoa Espelho da Lua, coada pela Nhamundá. A cunhã era linda com o corpo chupado pelos vícios, colorido com jenipapo.
O herói se atirou por cima dela pra brincar. Ci não queria. Fez lança de flecha tridente enquanto Macunaíma puxava de pageú. Foi um pega tremendo e por debaixo da copada reboavam os berros dos briguentos... (...) ´(pág. 28) O herói apanhava. (...) Afinal se vendo nas amarelas porque não podia mesmo com a icamiaba, o herói deitou fugindo chamando pelos manos:
- Me acudam que sinão eu mato! me acudam que sinão eu mato!"
Os irmãos imobilizam a mãe do mato e batem até que ela não tenha mais movimento. Macunaíma então brinca com ela quanto quer.
"Vieram então muitas jandaias, muitas araras vermelhas tuins coricas periquitos, muitos papagaios saudar Macunaíma, o novo imperador do Mato-Virgem.
E os três manos seguiram com a companheira nova. Atravessaram a cidade das Flores evitaram o rio das Amarguras passando por debaixo do salto da Felicidade, tomaram a estrada dos Prazeres e chegaram no capão de Meu Bem que fica nos cerros da Venezuela. Foi de lá que Macunaíma imperou sobre os matos misteriosos, enquanto Ci comandava nos assaltos as mulheres empunhando txaras de três pontas."
O herói passa a ter uma vida folgada. O dia inteiro na rede ou caminhando em volta da morada. Afinal, era o imperador.
"De noite Ci chegava rescendendo resina de pau, sangrando das brigas e trepava na rede que ela mesmo (pág. 29) tecera com fios de cabelo. Os dois brincavam e depois ficavam rindo um pro outro. "
(...)
"(...) Morto de soneira, infernizado, Macunaíma brincava para não desmentir a fama só, porém quando Ci queria rir com ele de satisfação:
- Ai! que preguiça!...
que o herói suspirava enfarado."
Dava as costas para Ci, mas ela não desistia.
"- Faz isso não, oferecida!
- Faço!
- Deixa a gente dormir, meu bem...
- Vamos brincar.
- Ai que preguiça!...
E brincavam mais outra vez. "
Expressões populares:
"Uma feita" - expressão típica das histórias infantis.
"guascar o lombo" - expressão gaúchesca; guasca é o mesmo que chicote.
"légua e meia adiante" - légua e meia é maneira popular de se referir a uma distância indefinida.
"cunhã" - moça, em tupi-guarani
"peito destro seco" - contam as lendas que as índias amazonas extirpavam o seio direito para melhor guerrearem de arco e flecha. O seio extirpado não atrapalhava os movimento.
"pageú" - qualquer instrumento de cutelaria produzido na região do rio Pajeú.
"um pega" - expressão popular urbana
"se vendo nas amarelas" - expressão popular paulistana da época
"Me acudam sinão eu mato" - expressão popular urbana para alguém que "foge para não matar". Obs.: sinão - Mário de Andrade propunha várias alterações na ortografia para aproximar a excrita da fala, ou seja, uma escrita fonética em lugar da existente, que é histórica.
Observação: O parágrafo que se inicia com "Vieram então..." é um bom exemplo da ruptura com a lógica espaço-temporal, inexistente no pensamento mágico.
(CONTINUA)
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