O texto que segue é um dos capítulos do livro infantil inédito Melinda.
Uma amizade ameaçada
Cansou
de chorar, encerrada sozinha naquele cubículo de cera escura, e de cansada
adormeceu. Já era quase noite (e Melina, ali fechada não sabia disso) quando
uma abelha de olhar agudo de tão inteligente abriu a porta e cutucou na cabeça
da jovem que dormia.
‒
Vamos, acorde, que precisamos de conversar.
Melina
tinha um sono pesado, mas naquela situação seus sentidos estavam todos muito
ligados, mesmo enquanto dormia. Bateu as asas com vigor e chegou a subir uns
centímetros do chão.
‒
Quem é a senhora? ‒ ela perguntou assustada.
‒
Aqui quem pergunta sou só eu. E você trate de responder direito, está
entendendo?
Sem
alternativa, Melina sacudiu a cabeça concordando.
A abelha
de olhar agudo sentou-se e mandou Melina sentar em sua frente. Então fez uma
pausa prolongada, olhando fixamente para o rosto da jovenzinha, parecendo
querer intimidá-la. Por fim, começou o interrogatório.
‒
Vieram me contar que você está insatisfeita com a dança informativa. Isso é
verdade?
‒
Bem, hoje de manhã...
‒
Não quero rodeios. Só me diga sim ou não.
‒
Sim.
‒
Além disso, você está pensando em inventar um novo tipo de dança.
‒ Olhe,
a história não é bem...
‒
Sim ou não? ‒ gritou exaltada a abelha de olhar agudo.
‒
Sim.
‒ E
que tipo de dança você está pensando em inventar?
‒
Não.
‒
Não o quê, menina.
‒
Não.
‒
Sim, mas não o quê? Vamos diga.
‒
Mas a senhora não me mandou dizer apenas sim ou não?
Surpresa,
a abelha de olhar agudo ergueu as sobrancelhas e abriu ainda mais os dois olhos
grandes, que ficaram maiores. Ela tossiu, usou as duas patas para limpar as antenas
e quase sorriu.
‒
Bem, menina, agora você já pode responder qualquer coisa.
‒ E
antes a senhora me permite fazer uma pergunta?
‒
Sim, pode fazer.
‒ E
promete responder apenas sim ou não?
‒
Prometo.
A
mais velha não percebeu o risinho escondido de Melina antes da pergunta.
‒ A
senhora continua roubando geleia real para comer escondida?
‒
Ora, menina...
‒
Sim ou não?
As
duas se puseram a rir porque a abelha mais velha não poderia responder apenas
sim ou não.
‒
Sabe ‒ disse a de olhar agudo ‒ eu não posso declarar que você seja muito certa
da cabeça, mas de errada, como vieram me dizer, é que você não tem nada.
‒ A
senhora é uma psiquiatra?
‒
Com muito orgulho.
‒ E
vai me deixar aqui presa neste lugar?
A
psiquiatra passou as duas patas dianteiras na cabeça de Melina, fazendo-lhe um afago,
piscou-lhe o olho direito e mandou-a embora.
‒
Vá, menina! Sonhar com alguma coisa que ainda não existe não é doença.
Melina
não esperou uma segunda ordem. Ergueu-se do solo e saiu como doida procurando
Apialina.
Na
saída da cela onde estivera presa, passou por um grupo de quatro zangões, gordos,
muito gordos, porque não faziam nada. Ao notar que eles riam dela, voltou na
mesma velocidade com que saíra e disse muito brava:
‒
Vão procurar um servicinho, seus inúteis, em lugar de ficarem aí mexendo com
quem está quieto.
Os
zangões ficaram muito admirados com a reação daquela adolescente, mas não
chegaram a responder, pois ela já ia longe.
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