quarta-feira, 7 de dezembro de 2016

CANTIGAS DE AMIGOS

Chronicas                             
(João Bosco*    -   in feito)

I

invadida a terra
em grotas, as almas devastadas

crianças sem riso
sem guerreiros, as espadas

sem honra, as florestas
as mulheres, desfolhadas

dos sábios, presas idéias
aos filmes, mordaças

no pórtico do ruinoso passo
a insígnia “ordem e progresso”

II

no país dos sem-sentido
um senso só delibera
romper com toda razão
quebrar o senso que impera

que vivam os mortos já
que penem os ainda vivos
na abundância escandalosa
dos que sempre têm comido

e um só riso a tudo resiste
muito embora desdentado
mão estendida em penhora

mas que sem prévio aviso
se muda em cutelo em riste
faz do penhor uma espora
III

que cabe na cozinha? lenha
que revela a fumaça? palma
que sobra das cinzas? alma

mas ora que se esconde na cozinha en
tre as trempes sob a lenha acima do fo
go no carvão das panelas no cascão da
s telhas nos tijolos encardidos nas tram
elas das portas há ali também a fala do
s escravos das negras dos negros das s
inhás e dos moleques brancos e negros
na barra da saia das aias das amas dele
ite de seus senhores brancos e negros d
a faina de acordar do sono
IV

e como demorasse a princesa
a acordar de seu demorado sono
deixou-se o reino a ficar
a mercê do próprio abandono

e como não lavrassem os homens
nem laborassem as mulheres
davam lugar a outros quereres
as casas murchas e apagadas


de tal modo, princesa, donos e donas
deixavam a marcha numa antiparada
que em pouco o outrora reino

se transformava agora sem fadas
em um reinar absoluto e vão

de toda alma que alcançasse o nada


*Poeta. Nasceu, em 1961,  no Sítio Barra do Riacho Seco, município de Novo Oriente, Ceará. Reside em Brasília desde 1972, onde trabalha também como Consultor Legislativo. É graduado em Letras (UnB, 1986), Mestre em Linguística (UnB, 2000) e Doutor em Linguística (UnB, 2009), com tese sobre a arte verbal do cordel. Autor de 27 livros, entre cordéis, infantojuvenis e ensaios.

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