quinta-feira, 13 de julho de 2017

ORELHA


Frequentemente Menalton é convidado a escrever orelhas de livros. Após tantos anos de carreira literária, já são inúmeras. Daí a ideia desta coluna que reúne orelhas de sua autoria e ajudar a divulgar os respectivos livros.

CATAGUASES, A MÍTICA

Não me perguntem qual o segredo de Cataguases porque também não sei. Há quem diga que são as águas do rio Pomba: tenho cá minhas dúvidas. Mas que é um berço fecundo de nomes para a literatura nacional, disso ninguém duvida. Nomes como Rosário Fusco e Ascânio Lopes foram sucedidos por Chico Peixoto, Luiz Ruffato, Ronaldo Cagiano e agora esta surpreendente Eltânia André, cujos originais tenho em mãos.

Manhãs adiadas é uma coletânea de catorze contos, sendo que o último, Estações, está dividido de acordo com um itinerário de seis estações – com textos independentes.
O livro é surpreendente por diversas razões, que em uma orelha não se vão esgotar. Uma delas, entretanto, que merece destaque, é o leque de conhecimentos (do ser humano e do mundo) que a autora aborda com desenvoltura. Outro aspecto a destacar é a riqueza de técnicas narrativas, as inovações, a diversidade de temas.

Manhãs adiadas pode ser divido em duas partes bem distintas. Até o oitavo conto, O canto da cigarra, predominam a prosa e a narrativa poéticas, em que o discurso assume o valor de elemento
fundamental dos contos. O primeiro conto, por exemplo, Parábola de Olgamaria, a despeito de escrito em terceira pessoa, é uma narrativa poética, com os ingredientes que os teóricos lhe exigem, como a circularidade e o mito.

Nesta primeira parte, a linguagem atinge momentos de poeticidade dignos de um escritor experiente e senhor das virtualidades da língua. Pois bem, Eltânia André, depois de um percurso mais ou menos longo, passando por funções administrativas, depois formação em psicologia, vem encontrar sua vocação na literatura com este segundo livro publicado.

Do nono conto, O rascunho da solidão de Alzira, até o último, a autora vai caminhar no fio da faca dos limites entre o conto e a crônica, dando passos ora de um lado ora do outro. A incorporação de elementos da realidade empírica (nomes, lugares, fatos) dá este sabor de relatos do mundo conhecido, ou seja, crônica de atualidades. Por outro lado, é nestes últimos textos que acontece uma inflexão no modo de narrar, aproximando sua linguagem literária de um coloquialismo popular, mas ágil e colorido.

Na segunda parte vão predominar cenas de rua, uma fila à espera de entrevista para emprego, crendice popular e a respectiva exploração, enfim, dramas urbanos, pequenos/grandes dramas de um cenário urbano.

A Eltânia soube captar com extrema sensibilidade tanto conflitos interiores, de cunho mais metafísico, como a trepidação dos seres humanos convivendo espremidos em uma grande cidade. Por tudo isso e muito mais, Manhãs adiadas merece ser lido.

                                                                                                     Menalton Braff



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