terça-feira, 18 de dezembro de 2018

'AMOR PASSAGEIRO' GANHA RESENHA NA REVISTA 'A NOVA CRÍTICA'

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EXPERIÊNCIAS RESSUSCITADAS NO INSTANTE

Passadas duas narrativas que terminam com mortes por afogamento, a leitura de “Canoa emborcada” envolve o leitor com uma tensão que se intensifica frase a frase.
O narrador observa, ao longe, crianças brincando na linha da arrebentação. Ele antevê o risco do mar, mentaliza um plano de resgate, mas não age. A situação se desenha no fluxo de uma série de pensamentos e considerações que se avolumam sinuosamente à maneira de algo ruim em vias de ocorrer.
Preciso sair daqui. Aquelas crianças podem estar em perigo. Elas provavelmente desconhecem as ciladas que se escondem por trás da aparência inofensiva das ondas ao trazerem sua espuma para depositar na areia. Meus pés afundam. Seria necessário arrancar meus pés da areia e me dirigir aonde estão as crianças para afastar qualquer perigo. Há algo em um movimento estranho sem que consiga identificar, relata.
Se há um aspecto comum aos contos que integram Amor passageiro, do gaúcho Menalton Braff, é o
funcionamento de uma mecânica de enredo sobre a qual incide um força desconcertante. Todas as histórias decorrem de ou incorrem em tragédias. De forma explícita ou implícita, são vidas que se racham em algum ponto.
Mesmo que essa linha do tempo se situe nos estágios da infância. Grande parte dos textos, aliás, engendra-se a partir de uma espécie de aprendizado ao mundo ao redor, imantado pela atração de um olhar que, embora pueril, traduz o peso das relações dos seres com suas misérias.
É o caso de “Abundância de estrelas no céu”, que acompanha o dia inteiro de um menino numa plataforma de ônibus, aguardando a chegada de um coletivo que lhe dê um destino. A passagem das cenas se correlaciona à uma esteira de fatos consumados, tratando com delicadeza e subentendimento sua condição de abandono.
“Além do limite” também é sobre um ciclo, porém maior, centrado no pareamento entre um menino e um ancião presos a uma vila pobre no qual o exílio faz as vezes de legado. O doído “Nossas perdas” recorre outra vez à sensibilidade para trazer o relacionamento afetuoso entre dois irmãos, assaltado por um golpe insuportável.
Desses três contos iniciais, é possível distinguir, da prosa de Braff, um cuidado na escolha das palavras e ordenamento das frases, alcançando um traço fino de lirismo que se irradia tanto pela composição do cenário quanto pelo timbre dos narradores. O efeito, no entanto, não gera uma voltagem que eleva as tramas para além do realismo cotidiano.
“Mãos ao alto” é um exemplo perfeito. Um sujeito invade uma casa para obrigar os moradores a rezar. A despeito do inusitado da situação, não chega a ser inacreditável. Braff trabalha muito com impulsos de consciência que vão gerar fatores situacionais. A princípio parece dispersivo, porém há uma articulação desenvolvida através da temática.
“Amor passageiro”, que batiza ao livro, retrata a iniciação do sexo, enquanto “Lúcia, a cortesã”, que vem na sequência, traça a biografia acidental de uma moça que recorre à prostituição para socorrer o pai doente. “Verdes águas” e “Um caso de paixão” tratam, com diferentes graus de consequência, o tema tabu do incesto.

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