quinta-feira, 19 de dezembro de 2019

CRÍTICA LITERÁRIA

Esta coluna, iniciada em outubro, reúne críticas literárias. As primeiras postagens conterão textos de Wagner Coriolano de Abreu, publicados originalmente no livro SEMPRE AOS PARES, lançado pela Carta Editora.


Caio Fernando Abreu na crônica


Caio Fernando Abreu se inscreve na literatura brasileira através de seus livros de contos, publicados a partir dos anos 70, embora o mais festejado seja o volume Morangos mofados, de 1982. Entretanto, o escritor pode ser lembrado também pela atividade de jornalista, iniciada ao final dos anos 60, quando é selecionado para redator da revista Veja e deixa os pagos do Rio Grande do Sul em busca da paixão pelo mundo e pelo tempo.

Tanto os contos quanto a crônica revelam um Caio poético, senhor de um intimismo que imbrica o passado gaúcho com a vivência de geografias pelas quais cruzou e anotou nos textos. Sobre a crônica, o livro Pequenas epifanias reúne as diversas que publicou em jornais, durante uma década.

Compensa repassar uma ou outra destas composições, quando se quer ilustrar o gênero brasileiríssimo de juntar o coloquial com a poesia. O escritor se mostra por inteiro em As primeiras azaléias. De seu apartamento, na cidade de São Paulo, meados dos anos 80, vê pela janela um casal de jovens, que estão tomados em torno de algum sentimento, pois a moça chora. Caio estica o instante e cria a atmosfera da paixão humana e seu mistério. O cronista que há nele não pode deixar de ver e registrar o desenlace da cena.

De uma viagem a Paris, na crônica Existe sempre alguma coisa ausente, anota o verso de Camille Claudel – existe sempre alguma coisa ausente que me atormenta – escrito na placa defronte à casa em que ela viveu a paixão por Rodin. Pelo título escolhido, deixa entrever o processo de amalgamar a citação a novas leituras e o faz pela genealogia das palavras e sentimentos, quando alguns anos depois retoma o verso, aproveitando-o como epígrafe de um conto.

Antes de comentar uma terceira crônica, recordo ainda que a antecedem outras três, intituladas de primeira, segunda e última carta, nas quais expõe a experiência pessoal com a doença que provocou

sua morte. Portanto, quando escreve Oito cidades alemãs e um Brasil, em outubro de 1994, oferece ao leitor mais que o relato de uma viagem, pois reafirma a lição corajosa de não se entregar.

Através da Deutsch Akademische Austausch Dienst (DAAD), Caio Fernando percorre várias cidades alemãs realizando leituras e respondendo perguntas sobre a cultura brasileira. Este projeto levou
escritores contemporâneos ao contato direto com o público ávido pelas notícias e sentidos de nosso país, cujo território é maior do que a Europa. O escritor observa que a audiência mostrou interesse não apenas pela diversidade cultural e geográfica, mas também pelos caminhos do governo. Nesta jornada, esteve acompanhado de Sérgio Sant’Anna e Ignácio de Loyola Brandão, autores de contos, novelas e romances, com os quais participou de mesas-redondas.

A seleção das três crônicas procura mostrar a gradação entre o alcance da expressão mais subjetiva, quando trata da coisa estranha em seu corpo, e a argúcia objetiva, quando trata da conjuntura política e cultural de sua época. Aqueles anos de cronista semanal, entre 1986 e 1995, revelaram sua ótima literatura a inúmeros leitores e alguns até saltaram do jornal para o livro, ampliando o horizonte de leitura.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

http://twitter.com/Menalton_Braff
http://menalton.com.br
http://www.facebook.com/menalton.braff
http://www.facebook.com/menalton.braff.escritor
http://www.facebook.com/menalton.para.crianças