quinta-feira, 9 de janeiro de 2020

CRÍTICA LITERÁRIA

Esta coluna, iniciada em outubro, reúne críticas literárias. As primeiras postagens conterão textos de Wagner Coriolano de Abreu, publicados originalmente no livro SEMPRE AOS PARES, lançado pela Carta Editora.

COM VOCÊS, IVO BENDER


(Wagner Coriolano de Abreu)

Antes de estar em evidência escritores enquanto marketing, bem antes, final dos anos 80, Ivo Bender visitou o curso de Letras da nossa Universidade, em São Leopoldo. Antes do bate-papo com os acadêmicos, esteve no bar da Comunicação ou do Direto, não sei mais a quem pertencia, para um cafezinho. Naquela altura, já consagrado pelas peças O macaco e a velha e O cabaré de Maria Elefante, entre outras, desfrutava o ambiente na mais discreta presença.

Tempos depois, final dos anos 90, reencontro Ivo Bender a palmilhar, com seus ares de omem de teatro, um corredor de outra Universidade, na Capital. Naquela ocasião, ele doutor, tradutor, com carreira de professor no Instituto de Artes da UFRGS, passava tranquilamente pelos estudantes e pares das Letras, sempre atencioso na sua reserva. Relembrar estas cenas parece fundamental diante da surpresa de descobrir, em meio a suas peças, ainda pouco conhecidas fora dos espaços de realização das artes cênicas, a construção de uma expressiva dramaturgia.

O professor e escritor Ivo Bender, natural de São Leopoldo, ocupou os palcos de Porto Alegre com mais de uma dezena de espetáculos, desde a estreia em 1961, com a peça As cartas marcadas.
Em 2003, o público assistiu extasiado à montagem de A ronda do lobo, uma das três peças que compõem sua famosa trilogia, de 1988, na qual desenvolve elementos da cultura grega, a partir de situações  relacionadas ao contexto da imigração alemã no Rio Grande do Sul.

Como professor, lecionou Literatura Dramática no Instituto de Artes, ministrou cursos e proferiu palestras em outras Universidades. Leitor atento dos clássicos, escreveu ensaios sobre a tragédia grega de Sófocles e de Eurípedes, traduziu o francês Jean Racine, o inglês Harold Pinter e a poeta norte-americana Emily Dickinson. Como dramaturgo, escreveu peças para crianças e adultos, atuou como ator e diretor teatral.

À parte esta breve notícia literária, síntese de uma vida que extrapola as convenções mas não perde o fio, é preciso reconhecer a persistência de Ivo Bender em face dos campos difíceis de sua escolha: o magistério e o teatro ou vice-versa. No mesmo ritmo, o ensino caminha com a invenção teatral, e lentamente constituiu o estabelecimento de uma história do tablado entre nós. Nesse sentido, o seu trabalho se torna exemplar em face da luta pela preservação da memória cultural.

Tanto nas tragédias da Trilogia perversa como na comédia  O boi dos chifres de ouro, o escritor demonstra o domínio de técnicas de ação dramática com as quais esteve lidando em sala de aula, no esforço de recuperar a lição grega da arte nos palcos. Não foram poucas as vezes a insistir que nos faltava um conhecimento acerca da ação no texto de teatro, algumas vezes até convidando as novas gerações a um passeio pelo texto de Aristóteles. “E o que é ação teatral em última instância? Poderia ser definida como a luta de alguém para alcançar alguma coisa, num determinado tempo, num determinado lugar e de uma certa maneira. Isto é ação dramática, o resto é bobagem”. Assim falou Ivo Bender.

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