O violinista
A
porta do clube era um clarão de festa sobre o escuro da noite garoenta, quando
atravessei a rua muito perpendicular e apressado, pisando por cima de sua
umidade. Mal atingi a calçada, o lado de lá, me dei conta de uma certa inflexão
familiar naquele som que escapava pelas aberturas do saguão. Não pela melodia,
uma ária plangente e bela, executada com bastante freqüência por muitos
violinistas. Não. O que me parecia familiar era a execução. Eu conhecia apenas
um violinista capaz de arrancar tais soluços das notas mais graves de seu
instrumento, que se alternavam com gritos agudos e lancinantes. Em suas mãos, o
instrumento tinha alma.
Só
então me lembrei de que há mais de seis meses, desde a crise da Orquestra Sinfônica,
não tinha tido notícias do Antenor Braga, seu jovem spala. Várias vezes
fui visitá-lo no camarim e o encontrava sempre estudando como se fosse aquela
sua primeira apresentação. Em minhas críticas no Diário, não me cansava de elogiar
o talento que o jovem aliava a um estudo muito sério. Não sei se me culpo a mim
ou à vida que levo pelo esquecimento, mas a verdade é que durante este tempo
todo muito poucas vezes pensei no meu amigo.