quarta-feira, 23 de outubro de 2019

CANTIGAS DE AMIGOS

I*
(João Augusto)
Não sei soletrar a palavra mundo
sem abrir nela uma rosa, uma infância.
Queria fazer da vida um objeto de arte.
Fazer de cada passo um passo com alguém.
Como se cada derrota sobrevivesse a si mesma,
e um balão subtraísse do ar a solidão que voa
entre mim e você.
Me isolo num verso que não vem.
Escavo um poema de meu tempo.
A palavra só existe onde o silêncio permite.
É preciso amadurecer, como algumas palavras,
como essa barba que se vai desenhando branca.
O motor dos dias esconde de ti a cidade,
o reino, as fadas.
Sou menor que todas as coisas que
ainda não existem.
Porque cumpre em qualquer nascimento
alguma alegria.
Toda a minha vida está incomunicável.
Preciso desembrulhar o rosto do mundo
e dar um nome ao que desconheço.
Preciso fazer da loucura um pouso para o amor.
Preciso soletrar a palavra mundo
sem abrir nela uma partida.
E, mesmo se partir,
levar nas mãos alguma aurora.

* Da série de poemas numerados - 04 de julho de 2012

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