quinta-feira, 30 de abril de 2020

CRÍTICA LITERÁRIA

OS CONTOS DE IVO BENDER

 (Wagner Coriolano)


O escritor brasileiro Ivo Bender, com mais de quarenta anos de produção teatral, volta aos campos literários com um livro de narrativas, Contos (2010), reunião de nove contos que traçam um mapa territorial e imaginário do Rio Grande do Sul, como bem anotou a crítica Regina Zilberman, que assina as palavras da apresentação. Em vários trechos do livro, cuja capa vermelha põe em destaque as letras do título e o nome do autor, o leitor encontrará a citação de poemas, ora do cancioneiro local, ora da alta poesia norte-americana.

Como na canção Águas de março, de Antonio Carlos Jobim, onde o compositor carioca transita entre a natureza (é pau, é pedra, é um resto de toco) e o humano (é um pouco sozinho), a literatura de Ivo Bender mistura a natureza e sua exuberância com a interioridade humana e seus complexos. Seis palavras selecionadas do sumário apontam a força da natureza. Campo, vale e pedra, substantivos ligados à terra; tília, espinheiro e corticeira, substantivos ligados à flora designativa de árvores. O nome dos contos antecipa o mostruário riquíssimo que o leitor encontrará dos elementos típicos da terra gaúcha.

Ao lado da natureza, por meio de cuidadosa composição literária, o escritor adiciona o tempero da humana condição. Os nove contos narram as veredas da sexualidade de todos os tempos. Campos de Santa Maria do Egito narra o desaparecimento de uma curandeira, após ter sido atacada por dois homens, com sede de mulher. Vale das tílias circula em torno de suposto adultério. Sonora conta de corpos que se unem às escondidas. Pedra marcada destaca a metamorfose de uma mulher, que realiza por fim o amor de carne, como dizia o Vinícius de Moraes. Brau Lopes fala em dois homens com a mesma mulher. Espinheiros conta de um pai que entrega a filha, a fim de aplacar a insânia de outra mulher. Mercês conta de um triângulo amoroso, que envolve uma mulher sozinha com casal de mulheres.

Aljofres apresenta certa volúpia de homem solteiro que é visitado pelo espectro de uma escritora. Por fim, em Corticeira, a estudante de fulgurante cabeleira se deita com seu treinador do colégio tradicional.

Com estes contos, Ivo Bender nos traz uma literatura muito exigente, que extrapola uma primeira visita ao texto. A bem da verdade, esta obra literária amplia a galeria das narrativas que têm relevância no quadro de nossas letras. Não tem como deixar de lembrar o trabalho de Dyonélio Machado e de Cyro Martins, sob o ponto de vista da representação psicológica, quando descemos o pano ao final desta jornada, amparados pela mão alegórica com que explora a contemporaneidade regional.

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