quinta-feira, 4 de abril de 2013

TEXTOS DE AMIGOS

O poema que segue está no livro Canção dentro da Noite, de meu amigo Ronaldo Cagiano, poeta e contista dos mais prestigiados do país.

               A Rua

A rua sem ninguém, um rio seco,
escuro corredor de muitos ventos.
           Ciro José Tavares



A rua está ausente e longínqua,
como uma estepe inatingível,
sobre cicatrizes de antigas procissões
e revolvida pelo séquito
de solenes funerais.



O frio de agora não vem do tempo,
mas do silêncio abissal
de casas adormecidas,
com seus telhados ásperos
e gatos vadios
mastigando teias pelo alpendre.

Artéria fatigada
por onde já não escorre
sequer o sangue coalhado das memórias,
mas seus jazigos perdulários
guardam remotas oferendas,
angústias e avarias
da guerra da cada um.

Passa por ela
uma legião aborrecida
de cantos inaudíveis,
séquito de fantasmas,
onde jaz, nas portas
e suas fechaduras hediondas,
a solidão de gerações esquecidas nas paredes,
sarcófagos e testemunhas
da inexorabilidade do tempo. 

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